Armageddon Time (James Gray, 2022)

Desde o lançamento de Fuga para Odessa em 1994 e seu sucesso no circuito de festivais, as obras de James Gray passaram a ser observadas de perto pela crítica. Como era de se esperar, foi o que ocorreu com Armageddon Time, que foi aclamado no Festival de Cannes, foi grande destaque da 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e está sendo lançado amanhã,10 de novembro, em uma ampla gama de cinemas.

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O diretor segue a linha de outros projetos como Belfast e Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades, nos quais uma história fictícia é utilizada como plano de fundo para discutir seu próprio passado. Somos levados ao Queens nova-iorquino dos anos 1980, próximos à eleição de Ronald Reagan, acompanhando o filho mais novo de uma família judaica, Paul. A partir de seu primeiro dia de aula, vemos o desenvolver de seu ano e de sua amizade com Johnny, o único garoto negro da sala. Mesclando o clima nostálgico com algumas pautas sociais, o resultado é um filme bastante correto, mas pouco impactante.

Há elementos que se destacam positivamente na obra, como a fotografia primorosa de Darius Khondji – um estabelecido diretor de fotografia, nomeado a diversas premiações e que trabalhou com grandes diretores como Gus Van Sant, Bong Joon-ho e Michael Haneke. Neste filme, se destacam elementos como os enquadramentos bem planejados e o uso controlado de luz, remetendo à iluminação artificial de lâmpadas de tungstênio, e conseguindo traduzir ao espectador a visão inocente e autocentrada do protagonista.

Apesar da atuação surpreendente de Banks Repeta como Paul, saindo de seu recente papel no terror O Telefone Preto para algo mais dramático, é por conta desse foco excessivo no protagonista que a história se torna por vezes enfadonha e chega a passar uma mensagem um pouco problemática sobre o papel de pessoas brancas na luta contra o racismo. Ele se tornar enfadonho pode ser parte de uma técnica narrativa considerando o protagonismo de uma criança, mas acaba distanciando seus espectadores adultos pela demora em seu desenvolvimento. O uso dos outros personagens apenas como coadjuvantes da história principal ajuda a criar essa falta de identificação, dado o recorte de período e identidade específicos e não havendo muita profundidade em nenhum outro arco.

O segundo elemento é mais complexo, pois envolve a estrutura da obra e a mensagem que ela parece passar. Há um elemento familiar envolvido, com o uso da relação entre avô e neto, e depois entre pai e filho, que indicam uma preocupação em tornar o mundo um pouco melhor a cada geração que se passa, a partir do arsenal afetivo que cada um desenvolve. Só que exatamente pelo recorte muito específico e não ousar mostrar nada que estava ocorrendo fora deste recorte, não se fala sobre movimentos sociais importantes ocorrendo no mesmo período nos Estados Unidos, como movimentos anti racistas que ocorriam desde os anos 1960. O personagem de Johnny é utilizado apenas como uma contrapartida na consciência do protagonista sem gerar nenhum movimento ativo em sua vida.

As reflexões propostas acabam sendo menos interessantes do que suas obras anteriores. Há momentos carinhosos e até emocionantes, dada a habilidade técnica e sensibilidade de todos os envolvidos, mas assim como nos outros filmes que se relacionam com a biografia dos diretores, esse fator nostálgico não permite que o filme se desenvolva da melhor maneira possível para a ficção.

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