Jurassic Park (EUA, 1993)
Título Original: Jurassic Park
Direção: Steven Spielberg
Roteiro: Michael Crichton, David Koepp
Elenco principal: Sam Neill, Laura Dern, Jeff Goldblum, Richard Attenborough, Bob Peck e Martin Ferrero
Duração: 127 minutos
Distribuição: Universal Pictures
Sinopse: Um milionário traz à vida dinossauros extintos há milhares de anos, criando um imenso parque. Mas os gigantes pré-históricos começam a ameaçar a vida dos visitantes.
“Life finds a way.”
Não é só uma frase icônica do Dr. Ian Malcolm; é a essência de Jurassic Park, o filme que redefiniu não apenas os dinossauros no imaginário popular, mas também o próprio cinema de espetáculo. Steven Spielberg, um diretor em pleno domínio de sua linguagem, entrega aqui não um blockbuster qualquer, mas um exercício meticuloso de tensão, maravilhamento e narrativa cinematográfica que ainda ressoa mais de três décadas depois.

Diferente da pirotecnia gratuita que infesta a maior parte dos lançamentos grandiloquentes atuais, Jurassic Park encontra sua força numa consciência aguda da linguagem que o molda. Spielberg não filma apenas dinossauros: ele filma o tempo, o espaço e a tensão entre o conhecido e o desconhecido. Antes do T-Rex romper a cerca, há o som da chuva, a vibração do copo d’água, o silêncio carregado que prenuncia o caos. Essa antecipação, esse domínio do tempo narrativo é o que separa o filme de tantos de seus herdeiros contemporâneos, que confundem ruído com impacto, e velocidade com emoção.
O diretor conduz sua narrativa com um rigor que beira o artesanal. O parque, com sua promessa de maravilha e controle absoluto, não é apenas o cenário de um desastre. Ele é, por si só, uma metáfora. Spielberg, Crichton e Koepp (estes últimos dois sendo o autor do livro e o roteirista, respectivamente) estruturam um filme onde a ação emerge da falha moral dos personagens, não apenas do acaso. Hammond é um sonhador vaidoso, obcecado por controle; Malcolm, o cínico que antecipa o colapso; Grant, um homem que rejeita crianças e termina abraçado a duas, depois de sobreviver ao caos. Nenhum personagem é passivo: todos carregam em si uma falha, uma resistência, um desejo, e é disso que nasce a força dramática do filme.
Spielberg não busca o excesso estilizado; sua aposta é mais clássica, mas não menos precisa. Ele filma os dinossauros como quem filma um milagre, com reverência e impacto. A trilha de John Williams surge apenas nos momentos certos, nos de admiração, não nos de perigo. Porque, nos momentos de tensão, o que impera é o som diegético: o estalo de galhos, os passos pesados no barro, o clique da porta que não tranca. Não é a música que carrega a cena, é o design de som que nos imerge.
E por falar em som, Spielberg foi tão hábil na construção do espetáculo audiovisual que não surpreende que Jurassic Park tenha levado seus Oscars por som, efeitos sonoros e visuais. A computação gráfica, usada com parcimônia e sempre em benefício da narrativa, ainda hoje impressiona por sua organicidade. Ao invés de mascarar a ação com cortes excessivos, Spielberg nos oferece planos longos, onde o digital e o prático convivem sem fricção, conferindo aos dinossauros uma presença física rara mesmo nos padrões atuais.
Mas o que talvez torne Jurassic Park tão perene é o modo como Spielberg articula, com elegância quase invisível, os níveis macro e micro da narrativa. Enquanto o mundo entra em colapso ao redor, há um homem descobrindo sua própria capacidade de cuidado, de transformação. A garra do velociraptor, jogada ao chão na cena da árvore, diz mais sobre o arco de Grant do que qualquer diálogo expositivo. É cinema puro, é a ação que revela personagem, imagem que carrega sentido.
Num momento em que o cinema comercial se vê engolido por fórmulas, onde blockbusters preferem o excesso pela repetição, Jurassic Park permanece como um lembrete do que significa construir entretenimento com inteligência, emoção e forma. Spielberg entrega um filme que não apenas entretém, mas que compreende profundamente o meio pelo qual se comunica. É um filme que deposita sua fé na força da imagem. E, como toda grande obra cinematográfica, encontra nessa fé sua eternidade.