Breve História do Planeta Verde (Santiago Loza, 2019)

Ao ler a sinopse de Breve História do Planeta Verde, do argentino Santiago Loza, o espectador pode imaginar qualquer tipo de filme com a tal premissa: uma mulher trans cuja avó morre e se vê com a incomum tarefa de devolver um alienígena para o local onde ela o encontrou. A partir de algo tão absurdo, se tornam quase infinitas as possibilidades de lidar com a temática.

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A abordagem escolhida pelo diretor é a de construir personagens que representam ideias, sendo os três principais uma mulher trans, um homem cis gay e uma mulher cis hétero, mas que não se vê presa ao olhar masculino para viver sua vida. Essa escolha, por um lado, ajuda a criar um dos maiores impactos de todo o filme, que é a falta de reações ao fato de existir um alienígena na Terra. Talvez por mostrar a história por esse ponto de vista de pessoas marginalizadas e que precisaram ter empatia muitas vezes ao longo da vida, como uma crítica aos absurdos da vida moderna, ninguém que é apresentado ao E.T. se surpreende, e a missão de devolvê-lo se torna mais prática do que uma jornada emocional.

Por outro lado, ao não criar muitas particularidades nos personagens, falta uma profundidade que tornaria as ações em tela mais impactantes. Quando Tania sofre lgtqfobia por um colega de história, qualquer espectador com empatia irá se indignar, mas por conhecer essa pessoa tão superficialmente, o impacto dessa situação não é potencializado. No entanto, o olhar do diretor é respeitoso e não recorre aos estereótipos mais óbvios relacionados a cada personagem, com atuações igualmente empáticas e naturalistas.

A escolha por locações mais genéricas, que mostram o interior da Argentina, ajuda a manter o ar de mistério em torno do acontecimento, localizando-o em um momento e local incertos. Utilizar uma imagem de alienígena simples e clássica, homenageando os clássicos da ficção científica, reforça a noção da tipificação dos personagens e cria uma camada na fantasia na obra, dada a falta de diálogo com o realismo ao seu redor. Ele se equilibra então entre o real e o fantástico, entre a ficção científica e o conto de fadas, e acaba explorando pouco sua potencialidade temática da ideia e abordagem originais.

Ainda assim, é uma obra interessante para quebrar a noção de um cinema muito correto formalmente vindo da Argentina,algo bastante comum no Brasil e que não se traduz nas suas produções independentes. E é também um bom passo da distribuição brasileira em relação à América Latina, com lançamento no circuito de cinemas de filmes menos comerciais.

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