Crítica | 14º Olhar de Cinema | Explode São Paulo, Gil

Explode São Paulo, Gil (Brasil e Portugal, 2025)

Título Original: Explode São Paulo, Gil
Direção: Maria Clara Escobar
Roteiro: Maria Clara Escobar e Gildeane Leonina
Elenco principal: Gildeane Leonina, Maria Clara Escobar, Ivaneide Cavalaro e Gilda Nomacce
Duração: 97 minutos

Um longo plano estático mostra Gilda Nomacce fazendo um monólogo sobre as desventuras de entrar em um novo trabalho, mostrando as vulnerabilidades a que está sujeita quando se entra em um novo ambiente, assim como as possibilidades de falar e de se calar que se apresentam neste contexto. Este é o excelente prólogo para uma obra que trata da reconstrução de sonhos de uma personagem real: Gildeane Leonina. Gil, como é conhecida e referida no título do longa, vive em São Paulo e tem uma relação de afetos e desafetos com a cidade. Se por um lado ela lhe permitiu melhores oportunidades de trabalho, por outro acaba a distanciando de seu sonho de se tornar uma cantora. Ou pelo menos é o que ela achava em 2015, quando o longa-metragem começou a ser captado.

Como acontece com muitos documentários, este também acabou tendo a sua trajetória marcada pelos acontecimentos externos ao filme, mas que abalaram todo o Brasil: o golpe sofrido por Dilma Rousseff, a ascensão e queda de Jair Bolsonaro, e todo o período de Covid-19. E, novamente, se por um lado isso fez com que todo o processo de captação e edição durasse 10 anos, pelo outro os desenrolares da vida real foram tão surreais que ficção nenhuma daria conta de criá-los.

Além dessa personagem incrível para centrar o documentário, há algo sobre a construção do próprio filme que é muito interessante. Ele faz questão de nos lembrar a todos os momentos que se trata de um filme, mostrando o dispositivo de filmagem, tendo personagens falando diretamente com as câmeras, discutindo os próximos passos sobre o próprio documentário. E também é perceptível que o processo do filme foi bem colaborativo e horizontal, diminuindo a hierarquia entre documentarista e documentada que, como apresentado, também tiveram em algum momento uma relação de contratante e contratada.

Mas, como nem tudo são flores, o passar dos anos também deixou suas marcas negativas no processo. A principal delas é a falta de uma linguagem que seja mais constante ao longo da obra. Começamos com um monólogo apresentado por uma atriz e logo passamos para cenas bastante disruptivas em linguagem, mostrando pedaços de São Paulo, pequenas cenas da Gil, um pouco dela apresentando sua arte e seu modo de viver. No entanto, logo tudo se torna muito mais comportado e narrativo, como se essa linguagem experimental fosse perdida. Só bem ao final do filme que se lembra dessa proposta, mas a cena acaba novamente deslocada por conta da falta de constância.

É impossível se afastar da impressão de que a possível quantidade de imagens geradas e o fato de a documentada ser muito multifacetada deixaram um trabalho gigantesco para a montagem. Essa, por sua vez, não consegue definir uma linha específica para seguir com o filme, se perdendo entre as possibilidades. Assim, por mais que haja muita expectativa com o começo impactante da obra, ela não consegue cumprir com esse início bombástico, perdendo o interesse do espectador ao longo de seu desenrolar.

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