Crítica | 50º TIFF | No Other Choice

No Other Choice (Coreia do Sul, 2025)

Título Original: Eojjeolsugaeopda
Direção: Park Chan-wook
Roteiro: Park Chan-wook, Lee Kyoung-mi e Jahye Lee, baseados no livro de Don McKellar
Elenco principal: Lee Byung-hun, Son Ye-jin, Park Hee-soon, Lee Sung-min, Yeom Hye-ran e Cha Seung-won
Duração: 2h 19min (139 min)

Se o filme Foi Apenas Um Acidente, visto no mesmo festival, trouxe uma discussão sobre a moralidade dentro de um estado autoritário, No Other Choice cria algo semelhante, mas a partir da ética do capitalismo.

Park Chan-wook já é conhecido por seus filmes de vingança, como Oldboy (2003) e A Criada (2016), e desde 2009 já falava sobre a vontade de adaptar o livro The Ax, de Donald Westlake, que já tinha a adaptação O Corte (2005) de Costa-Gavras. Seguindo a linha de raciocínio do livro, o filme traz um homem que trabalha há muito tempo na indústria de papel, Man-soo (Lee Byung-hun), e que repentinamente se vê sem emprego. Com pouquíssimas vagas disponíveis para o seu nível de especialização e se vendo cada vez mais incapaz mediante ao capitalismo selvagem sul-coreano, ele passa a utilizar métodos pouquíssimos ortodoxos para se livrar da sua concorrência.

Para quem conhece um pouco da carreira do diretor, a primeira cena causa um estranhamento. Temos uma família em uma casa lindíssima tendo uma refeição juntos, com marido e esposa que se amam, filhos talentosos e que estão minimamente presentes, dois goldens retriever – tudo banhado pela luz do início do pôr do sol e pétalas caindo de árvores. É até interessante ver como um diretor tão experiente e com controle tão claro da linguagem cinematográfica constroi essa imagem completamente oposta ao que normalmente se espera dele.

Isso ajuda a criar o clima perfeito para se entender que tudo o que acontecerá em seguida será uma grande desconstrução desse imaginário. Cada um desses personagens apresentados terá seus próprios conflitos e dilemas, com tudo se iniciando no momento em que Man-soo, que trabalha há anos na mesma empresa, é demitido por conta de uma automação que utiliza inteligência artificial. Em um país e em uma situação na qual ter dinheiro é altamente relevante para sustentar o padrão de vida existente até ali, isso aparece na narrativa como a realização de seus piores pesadelos.

Se iniciam as cenas de caos e desespero que contrastam absolutamente com a perfeição equilibrada apresentada na cena inicial. Somos introduzidos a este universo de alta competição, de terapia de compreensão da situação, de recolocação em um lugar cheio de adversidades. E aos poucos, vamos percebendo a mudança de vida do nosso protagonista até o ponto em que ele percebe que a melhor opção é eliminar a sua competição.

Mas diferentemente de outras obras do mesmo diretor, também é interessante perceber como ele gesta um matador trapalhão. Diferentemente de outros personagens de sua filmografia, Man-soo não é nem treinado para matar nem tem um grande motivo real para fazê-lo. Pelo contrário, apesar de seguir repetindo que aquela é sua única escolha, isso tem muito mais a ver com suas inseguranças e com um machismo estrutural que o coloca nessa figura de provedor. Assim, por mais que haja um rebuscamento na forma de filmar típico do diretor, ele propositalmente coloca as cenas violentas de forma mais cômica – confirmando essa questão da pessoa comum decidindo matar.

Como sempre, a utilização da fotografia se coloca como um dos elementos essenciais para o bom funcionamento do longo filme. Entre ângulos inesperados, movimentos de câmera rebuscados e um trabalho em conjunto com a montagem para criar transições de cenas particularmente bem pensadas, essa marca de seu cinema vem também com uma pitada de ironia. Isso acontece porque o personagem principal tem diversas conversas sobre o seu apego ao papel, e o diretor é notadamente uma pessoa que se entregou ao cinema digital na primeira oportunidade que teve.

Se algo negativo pode ser dito sobre a obra, é que ela acaba se tornando um tanto extensa e que ela cria muitas narrativas secundárias que não são tão bem aproveitadas. Percebe-se que há um esforço em criar uma profundidade para cada um dos membros daquela família, refletindo o quanto a vida desse pai tem de impacto em cada uma dessas pessoas. Ainda que a intenção seja boa, há muitos elementos que parecem um pouco perdidos ou que são simplesmente esquecidos ao longo do filme.

Ainda assim, a experiência é muito mais divertida do que se possa imaginar em um primeiro momento. Se nos sentamos na ponta da cadeira em diversos momentos do longa, isso é compensado com uma boa dose de divertimento e ironia. Fica ainda para o final da sessão a reflexão sobre a exploração do trabalhador e os impactos da IA na empregabilidade em todo o mundo.

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