Extermínio: A Evolução (Reino Unido, EUA, 2025)
Título Original: 28 Years Later
Direção: Danny Boyle
Roteiro: Alex Garland
Elenco: Jodie Comer, Aaron Taylor-Johnson e Ralph Fiennes
Duração: 115 minutos
Disponível em: Sony Pictures
23 anos depois de revolucionar o cinema de zumbis com Extermínio e suas criaturas velozes, Danny Boyle e Alex Garland se reúnem novamente para a primeira sequência que faz parte do cânone oficial da série (Extermínio 2, de 2007, não teve o envolvimento dos dois e não é considerado na continuidade narrativa da franquia). Não dá pra ignorar as expectativas, ainda mais considerando que, de lá pra cá, os dois se estabeleceram como ótimos cineastas, com carreiras sólidas e diversos filmes elogiados.

Foi com prazer que recebi muito bem este novo filme. Se tínhamos alguma dúvida de que Danny Boyle ainda seria capaz de entregar uma boa direção (uma sensação justificada depois de alguns de seus últimos trabalhos) ou de que Alex Garland ainda teria boas cartas na manga (idem), os dois nos passam a perna e nos entregam um belo primeiro capítulo de uma nova trilogia. Vale dizer que, talvez, este seja o único problema desse filme: ser o primeiro de uma nova série. “Talvez” porque é um filme que não só se assume como um primeiro capítulo, como lida com isso de forma magistral, desenvolvendo as informações que precisa desenvolver para que a narrativa se complete sem furos e deixando muitas outras no ar, que não precisam ser desenvolvidas agora e já vão construindo a mitologia da franquia para que os próximos filmes possam partir desses ganchos. Por outro lado, não deixa de ser um pouco frustrante sair do cinema com a sensação de que muito do que vimos indica caminhos interessantes, que vamos ter que esperar mais um bom tempo para ver aonde nos levam – e onde Boyle e Garland querem chegar com esse novo trabalho.
Aqui abro este breve parêntese para comentar que o segundo filme da trilogia foi filmado em paralelo ao primeiro. A direção é de Nia DaCosta, de A Lenda de Candyman, e será lançado nos EUA já em 16 de janeiro. O terceiro, que contará com a direção de Boyle novamente, está em processo de pré-produção e deve demorar um pouco mais. Os três roteiros foram escritos por Garland.
As cenas de terror são muito bem feitas e conseguem gerar tensão. Boyle e o diretor de fotografia, Anthony Dod Mantle (que também fotografou o filme de 2002), criam imagens assustadoras por si só, como na primeira vez em que Jamie e Spike (Aaron Taylor-Johnson e Alfie Williams, sensacional em seu primeiro papel), pai e filho que protagonizam o filme, encontram um grupo de contaminados e vemos as silhuetas das criaturas aparecendo uma de cada vez no topo de uma colina. Enquanto isso, Jamie aponta para a primeira que apareceu e nos apresenta o conceito de “alfa” – um zumbi que é mais evoluído do que os outros, sendo maior, mais resistente e inteligente e que age como um líder no caso de grupos.
A escolha de filmar com celulares e usar o efeito bullet time, consagrado pelas Wachowskis em Matrix, que congela a imagem e permite uma mudança de ângulo do plano, gera imagens tremidas, mas compreensíveis. O efeito aparece sempre que há uma morte, como que para destacar e causar ainda mais desconforto com a violência. A montagem de Jon Harris nos permite acompanhar a ação, a correria e a matança de forma surpreendentemente fluida para um filme que usa tanta câmera na mão sem estabilizadores.
A narrativa do filme vai direto ao ponto. Em nenhum momento se enrola ou se demora em cenas desnecessárias. É um filme que sabe aonde está indo e não se deixa atrapalhar. Nesse sentido, é muito legal ver como a estrutura do roteiro vai se mostrando cada vez mais episódica sem que isso se torne um problema. Pelo contrário, as mudanças bruscas na narrativa fazem sentido e te deixam cada vez mais preso, querendo saber o que vai acontecer e para onde estamos indo (aqui reforço o que comentei no começo do texto sobre a frustração de ter que esperar ainda mais pelas continuações). Para melhorar, Jaime, Spike, Isla e Dr. Kelson são personagens bem escritas, a quem nos apegamos facilmente – o que aumenta a tensão quando alguém está em perigo e nos deixa ainda mais curiosos para saber como a história de cada um se desenvolverá. Ajuda também o ótimo trabalho do elenco, que dá vida à essas pessoas de forma natural e crível. O terceiro ato, que se revela mais dramático do que assustador, tem diálogos muito bonitos, que mexem com o espectador e nos carregam com leveza por um momento pesado da narrativa. Enquanto fã dos primeiros trabalhos de Garland, não pude deixar de questionar o que o fez se distanciar dos filmes de ficção científica. Como comentei, este roteiro nos mostra que ele ainda tem muita força e é capaz de trazer boas histórias quando não está mais preocupado em nos mostrar cenas ultra-realistas de guerra.
Falando nisso, é perceptível em alguns momentos que Boyle cedeu um pouco de seu estilo de direção ao de Garland, quase como que reconhecendo o trabalho do parceiro e filmando partes de seu roteiro próximo a como ele teria filmado, sem abrir mão de si mesmo. Algo que, para mim, engrandece o filme, como se juntasse pontos fortes dos dois e reconhecesse a necessidade de caminhar em coletivo – tema recorrente na franquia, trazendo o conteúdo também para a forma.
O filme se encerra com uma cena final um tanto curiosa, que novamente gera desconforto em quem assiste. É pra rir? É só uma coisa ridícula que não faz muito sentido? De onde isso veio? De toda forma, é uma escolha corajosa terminar o filme em um tom bem diferente do que vimos até então. Já é possível saber o que esperar do segundo filme, gostemos disso ou não.
Ao passar por diversos temas e abrir uma quantidade ainda maior de perguntas sobre a mitologia da franquia, o filme se mostra ousado em explorar o mundo em que se passa. O roteiro toca em questões como o porquê de depois de todo esse tempo as pessoas infectadas ainda estarem vivas (“vivas”?), se seria possível elas se reproduzirem, se são capazes de sentir emoções umas pelas outras, se o vírus evoluiu – como sugere o título nacional -, o que gera um alfa e como crescer em um espaço isolado do resto do mundo pode afetar uma pessoa. Como seria crescer hoje em dia, em um espaço sem celulares, sem nem sequer eletricidade?
O fato é que só teremos noção do escopo da obra depois que os próximos filmes forem lançados, mas o que já recebemos por enquanto é um ótimo filme, que nos atravessa de diversas formas e nos deixa com o famoso gostinho de quero mais, apesar de se sustentar muito bem sozinho. Um presente para os fãs que esperaram por mais de duas décadas.