Muito Esforçado (EUA, 2025)
Título Original: Overcompensating
Temporada: 1
Criação: Benito Skinner
Elenco principal: Benito Skinner, Wally Baram, Mary Beth Barone, Adam DiMarco, Rish Shah, Corteon Moore, Owen Thiele, Nell Verlaque e Holmes
Episódios: 8
Disponível em: Amazon Prime Video
O caos emocional da juventude queer em uma comédia ferozmente sincera
Existe uma linha tênue entre o riso e o desconforto, e Muito Esforçado caminha sobre ela com a precisão de quem entende que o exagero muitas vezes nasce da dor. Criada por Joel Kim Booster e protagonizada por Peter Smith, a série universitária não se contenta com os moldes tradicionais do gênero. Ao invés disso, explode em cores, ruídos e sentimentos, encontrando no excesso uma forma legítima de narrar a experiência queer contemporânea.

Na trama, acompanhamos Benny, um ex-atleta tentando conciliar os papéis que lhe foram impostos com os desejos que aprendeu a esconder. Interpretado por Smith com um misto entre dureza e delicadeza, o personagem se revela aos poucos, em gestos truncados e silêncios incômodos. Sua jornada é menos sobre se assumir e mais sobre se entender – num ambiente onde todo mundo parece encenar versões idealizadas de si mesmo.
Ao lado dele está Carmen, figura caótica e magnética que usa o humor, a fantasia e a performance como mecanismos de defesa. Juntos, eles formam uma dupla errática e cativante unida pelo impulso de escapar da dor – ainda que isso signifique mergulhar nela. As dinâmicas entre eles oscilam entre o afeto genuíno e a autossabotagem, dando forma a uma narrativa que se recusa a ser linear ou confortável.
Com ritmo acelerado e estética visual que remete a um feed de TikTok dirigido por um adolescente dramático dos anos 2000, a série não teme parecer excessiva. E essa é justamente sua força: em vez de diluir o drama, ela o amplifica com referências à cultura pop que vão de Britney Spears a My Chemical Romance, evocando memórias afetivas que transcendem o simples saudosismo. O uso de músicas icônicas não serve como trilha sonora genérica, mas como ferramenta narrativa – intensificando emoções, revelando estados de espírito.
Apesar do tom escrachado, Muito Esforçado se ancora em estruturas emocionais sólidas. Os episódios, embora repletos de situações absurdas – como uma bolsa de academia recheada de coqueteleiras ou um chicote usado fora de contexto –, sempre desembocam em alguma forma de vulnerabilidade honesta. Quando Benny desmorona, perguntando se ainda é possível ser amado, a série cala o ruído ao redor para deixar só o essencial: o desejo de ser visto de verdade.
Nem tudo, no entanto, encontra resolução satisfatória. Algumas subtramas – como o conflito entre Carmen e Benny após uma traição emocional, ou a relação do protagonista com o irmão e um trauma mal resolvido – carecem de maior desenvolvimento. Ainda assim, os personagens são fortes o bastante para carregar as lacunas sem perder potência dramática. Coadjuvantes como Hailee, com seu humor solar, e George, cuja presença catalisa o arco de autoconhecimento de Benny, enriquecem o universo da série e mereciam mais espaço.
Visualmente vibrante e narrativamente ousada, a produção se alinha com obras como Sex Education, Broad City e até Glee, mas imprime sua própria marca ao transformar o constrangimento em estética consciente. Ao invés de evitar o cringe, ela o abraça – convertendo o desconforto em linguagem, e a disfunção emocional em motor narrativo.
No fim das contas, Muito Esforçado é uma meditação sobre a tentativa incessante de se ajustar a padrões inalcançáveis. Seja através da hipermasculinidade de Benny ou da feminilidade performática de Carmen, a série mostra como jovens queer aprendem, muitas vezes sozinhos, a sobreviver num mundo que exige versões domesticadas de sua autenticidade. A mentira, o exagero, o teatro social – nada disso é gratuito; são mecanismos de defesa diante do medo de ser rejeitado por quem se é.
Com uma primeira temporada que já nasce inspiradíssima, Muito Esforçado prova que é possível unir caos e afeto, sátira e sinceridade, num mesmo fôlego. Se for renovada, há terreno fértil para aprofundar ainda mais essas camadas. Por ora, entrega uma obra que compreende profundamente as contradições da juventude queer e oferece, entre piadas afiadas e confissões sussurradas, algo raro: representação sem concessões.