Crítica | O Deserto de Akin

Crítica | O Deserto de Akin (2024)
Direção: Bernard Lessa
Roteiro: Bernard Lessa
Elenco: Reynier Morales, Ana Flávia Cavalcanti, Guga Patriota, Welket Bungué, Patricia Galleto
Duração: 78 min
Distribuição: Retrato Filmes

A maioria das decisões políticas têm impacto sutil ou gradual, mas algumas têm efeito imediato na rotina dos cidadãos, representando verdadeiros dramas pessoais. O Deserto de Akin (2024) busca traduzir as consequências do desmonte de políticas públicas em um Brasil polarizado durante a eleição de 2018.

Akin (Reynier Morales) é um médico cubano trabalhando no Brasil por meio do programa federal Mais Médicos, prestando atendimento em áreas de alta vulnerabilidade social no interior do Espírito Santo. Estrangeiro em um território desconhecido, ele precisa se adaptar à língua e às dinâmicas sociais dos brasileiros. Aos poucos, ele vai criando intimidade com Érica (Ana Flávia Cavalcanti) e Sérgio (Guga Patriota) enquanto testemunha a formação de uma tensão política iminente que mudará o futuro – o dele, dos seus pacientes e de todo o país.

O diretor capixaba, Bernard Lessa (A Matéria Noturna, 2021), faz um retrato do chamado “Brasil profundo”, nos mostrando o interior menos visível e muitas vezes negligenciado do país por meio da fotografia que mistura belas paisagens e ambientes carentes e mal iluminados. O estilo visual muitas vezes transmite um ar de documentário ou reportagem jornalística.

Ao longo da história, acompanhamos as cenas do clima de incerteza e de preocupação provocado pela polarização que ameaça o movimento progressista e libertário que pairava até então. As analogias com a cobra – que Akin chama de inofensiva no início – e com a areia do deserto que “soterra povos”, em uma fala de Érica, são elementos narrativos poderosos que simbolizam essa frustração.

No entanto, como um todo, o filme apresenta problemas anacrônicos de direção de arte – como uso de celular que ainda não existia – e o roteiro possui passagens que não convencem muito, como a dor inesperada na perna que Akin sofre durante a visita da equipe médica aos pacientes indígenas. Apesar disso, o flerte com a medicina alternativa dos povos originários é um arco interessante, que poderia ter sido melhor aprofundado.

A atuação de Reynier Morales como Akin é neutra e delicada, conseguindo despertar a empatia do público. No entanto, o uso de figurantes e não atores, por vezes, deixa o longa com um ritmo lento, apresentando silêncios constrangedores.

No fim, a obra acena para a resistência, que seria o tema dos próximos quatro anos. Mas apesar da boa intenção de resgatar a memória recente do país, O Deserto de Akin é um filme político com dificuldades em envolver e convencer o público ao representar toda a complexidade de uma época recente do Brasil.

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