Superman (EUA, 2025)
Título Original: Superman
Direção: James Gunn
Roteiro: Jerry Siegel, Joe Shuster e James Gunn
Elenco principal: David Corenswet, Rachel Brosnahan, Nicholas Hoult, María Gabriela de Faría, Skyler Gisondo, Edi Gathegi, Isabela Merced, Nathan Fillion e Anthony Carrigan
Duração: 129 minutos
Distribuição: Warner Bros
Esperançoso e político, Superman de James Gunn inaugura nova fase da DC voando alto.
É um pássaro? É um avião? Não, é o Superman de novo. Ele já passou pela Guerra Fria, pela virada do século XXI, pelo 11 de setembro, pela desilusão política e agora aterrissa aqui, em 2025. A nova versão do herói americano retorna acompanhada pelo carismático cão Krypto e pela icônica cueca por cima da calça, mas a repaginada vai além disso. James Gunn encara o Homem de Aço de um jeito otimista e político. Entre os traços nostálgicos e os contornos pós-modernos, o diretor e roteirista redesenha uma das figuras mais clássicas dos quadrinhos e reforça o quanto ele continua atual nas telonas.

Por ser um dos super-heróis mais clássicos, sua história de origem é também uma das mais conhecidas. Todos sabem que Kal-El deixou seu planeta em colapso ainda bebê e chegou à Terra, onde foi criado por seus pais adotivos e passou a vestir o brasão do S no peito para proteger as pessoas. Com isso, Gunn economiza tempo de tela e parte para o atual conflito enfrentado pelo personagem-título: Superman (David Corenswet) se envolve na geopolítica mundial depois que Borávia invade Jarhanpur e se vê contra uma nação aliada dos Estados Unidos. Em meio à guerra, ele ainda enfrenta um velho arqui-inimigo: o magnata da tecnologia Lex Luthor (Nicholas Hoult).
A verossimilhança não é mera coincidência. Se você, assim como Superman, viveu no globo terrestre no último ano, pode correlacionar o contexto fictício com a guerra real entre Israel e Palestina. Também não é muito difícil enxergar que Luthor representa uma espécie de fusão entre Elon Musk e Donald Trump. Em entrevista ao jornal britânico The Times, Gunn confirmou o teor político da obra e ressaltou que Superman é uma metáfora para o imigrante na América. Aliás, Jerry Siegel e Joe Shuster, criadores por trás do ícone da DC, eram filhos de imigrantes judeus vindos do Leste Europeu. Os dois se tornaram amigos na infância e idealizaram um alienígena com superpoderes que combate a crueldade em seu novo lar.
Diante da recente tensão presente nos EUA por conta das incisivas políticas anti-imigratórias, é interessante como o diretor destaca que o personagem, uma figura tipicamente americana, não é originário de lá. Superman é um extraterrestre. Ele é um imigrante. E, se antes o herói era retratado como um cidadão de bem que não questiona a soberania dessa nação, agora ele reflete sobre o papel dela no mundo e os líderes que a comandam.
No decorrer da narrativa, o roteiro costura o reposicionamento político do protagonista com sua crise identitária. A missão de salvar o mundo, que deu propósito à sua vida até então, é posta em xeque e abala a admiração inexorável que Kal-El tinha por seus pais biológicos. A crise abre espaço para que Clark repense o motivo pelo qual vale a pena usar a capa vermelha e fazer o bem. Neste momento, ele abraça sua vulnerabilidade e percebe que se tornar mais humano pode torná-lo mais poderoso.
Nessa humanidade está o valor universal que James Gunn destaca como cerne da história: a bondade. O novo Superman vive em um mundo armado, dominado por meias-verdades e alimentado por discursos de ódio. Se, na versão de 1978, Lex Luthor se escondia em uma estação subterrânea como um verme, aqui o vilão impera do alto de sua torre. A maldade é estrutural e institucionalizada. Gestos de gentileza, empatia e solidariedade são o raio laser, o sopro congelante e a superforça de que Superman precisa para vencer a batalha. Pode soar piegas para os mais cínicos e descrentes na espécie humana — como muitos de nós nos sentimos por vezes —, mas o filme sabe como dar forma a esse sentimento de esperança em uma linguagem cinematográfica mais tradicional, sem parecer cafona ou antiquado.
Parte desse discurso também é construída na relação de Clark com Lois Lane (Rachel Brosnahan). O casal mantém um relacionamento discreto e tenta lidar com os dilemas éticos e morais que o heroísmo e o jornalismo atravessam. Boa parte do desenvolvimento fluido que eles têm, em meio a tantos elementos narrativos do roteiro, está na química entre David Corenswet e Rachel Brosnahan e em como captam as câmeras.
Ademais, a Lois Lane de Rachel Brosnahan não dá ponto sem nó. Ela é uma jornalista com J maiúsculo, assim como foram as de Margot Kidder, em 1978, e Amy Adams, em 2016. Contudo, diferente das duas, esta Lois não é derretida pelo homem da capa vermelha nem deslumbrada pelo namorado como uma figura messiânica. Brosnahan tem a língua afiada — o que, em parte, lembra seu célebre papel como A Maravilhosa Sra. Maisel — e faz perguntas para as quais Superman ainda não consegue elaborar respostas.
Por fim, este filme definitivamente não seria o que é sem James Gunn. O cineasta traz o senso de humor ágil e as cenas de luta divertidas ao som de boas músicas, marcas registradas de outros de seus projetos de sucesso no gênero, como a trilogia Guardiões da Galáxia e O Esquadrão Suicida. Tudo isso com um fan service eficiente e participações-surpresa que empolgam o público, mas não servem de muleta para o roteiro.
Superman é o pontapé inicial de uma nova fase na DC. O longa inaugura um período mais esperançoso para o estúdio, com um estilo que, em breve, pode se tornar tendência para os filmes de super-heróis, e que já começou voando alto.