Thunderbolts* (EUA, Austrália e Canadá, 2025)
Título Original: Thunderbolts*
Direção: Jake Schreier
Roteiro: Eric Pearson, Joanna Calo e Kurt Busiek
Elenco principal: Florence Pugh, Sebastian Stan, Julia Louis-Dreyfus, Lewis Pullman, David Harbour, Wyatt Russel, Hanna John-Kamen e Olga Kurylenko
Duração: 127 minutos
Distribuição brasileira: Disney
Thunderbolts: Grupo de anti-heróis desajustados chega para salvar o dia da Marvel após uma fase ruim do estúdio
Todos passamos por uma fase ruim, não é mesmo? Contudo, eu — assim como alguns fãs, e diria até a própria Marvel — temi que o estúdio talvez não estivesse apenas atravessando um momento difícil, mas sim que a era dos super-heróis estivesse entrando em declínio nos cinemas. Depois de alcançar a segunda maior bilheteria da história do cinema com Vingadores: Ultimato, em 2019, o MCU (Universo Cinematográfico da Marvel) saiu da ascensão para uma queda livre.

Dois dos últimos lançamentos estão entre as cinco piores bilheteiras do estúdio: As Marvels, lançado no fim de 2023, arrecadou apenas US$ 206 milhões (a pior bilheteria da história da Marvel), enquanto Capitão América: Admirável Mundo Novo, lançado em fevereiro deste ano, teve recepção morna do público e somou US$ 407 milhões. O cenário para a afiliada da Disney não era negativo apenas do ponto de vista do público, mas também da crítica. Afinal, Deadpool & Wolverine arrecadou US$ 1,3 bilhão nas telonas, mas não agradou aos críticos.
Neste clima de baixa temporada do MCU, Thunderbolts chegou sem grandes expectativas dos marvetes, mas surpreendeu. O longa conquistou a maior bilheteria do fim de semana de estreia e se tornou o filme mais bem avaliado do estúdio desde Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa (2021). Mas a pergunta permanece: Thunderbolts é realmente um bom filme?
O longa acompanha um grupo de anti-heróis contratados para eliminar uns aos outros, mas que percebem a armadilha e se unem para sobreviver. Classificados como “uma tragédia antissocial em forma humana”, eles tentam deixar para trás as crenças negativas que têm de si mesmos para salvar o mundo, ressignificando o legado deixado pelos Vingadores.
Um dos aspectos mais autênticos de Thunderbolts é a maneira como ele se assume ordinário, comum, quase medíocre. Ao dar protagonismo a personagens até então secundários no MCU, como a espiã altamente treinada Yelena (Florence Pugh) e o soldado coberto por cicatrizes Bucky (Sebastian Stan), o filme mergulha em figuras falhas e traumatizadas que contrastam com o estereótipo idealizado dos super-heróis. Eles não são os melhores, não estão prontos, não são unidos e, às vezes, nem têm certeza se são pessoas decentes. Mas, sem os Vingadores, são tudo o que o mundo tem para se defender.
Nesse sentido, a ponte com temas como saúde mental e instabilidade emocional transforma esses personagens em algo mais identificável para o público. Para que eles sejam heróis, precisa haver um vilão e, neste caso, os vilões são eles mesmos: seus traumas e seus pensamentos. Para vencer o inimigo, precisam vencer a si mesmos e as percepções que têm de si.
Além disso, a trama de Thunderbolts cresce justamente quando se encolhe. Em vez de um conflito apoteótico conectado ao multiverso, encerrado em batalhas épicas repletas de crossovers, o roteiro aposta no básico do gênero. Estes são os heróis que salvam civis, que arriscam a vida por quem está na calçada, e não os que viajam no tempo, no espaço e através das múltiplas realidades. Eric Pearson e Joanna Calo, roteiristas do filme, mostram que menos é mais e entregam uma narrativa “feijão com arroz” como há tempos a Marvel não fazia.
A direção de Jake Schreier, que já abordou sentimentos como solidão e raiva na minissérie Treta, sabe como lidar com o lado obscuro de seus personagens e iluminar suas feridas por meio das memórias. Nos aprofundamos no passado de cada um sem cenas excessivamente explicativas, mas com fluidez na montagem e na direção de arte. Schreier revela os flashbacks no momento certo, despertando empatia por cada integrante do grupo.
Por fim, a direção de elenco de Sarah Halley Finn e Molly Doyle — veteranas na Marvel e responsáveis pelo estelar casting de Vingadores: Ultimato, Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa e Pantera Negra — consegue escalar os artistas para além do nome nos créditos. Florence Pugh assume a liderança com carisma e entrega camadas de sarcasmo, vulnerabilidade e niilismo a Yelena. Sua performance se destaca não apenas pelas cenas de ação, mas pela densidade emocional, o que é raro no MCU.
Thunderbolts não revoluciona o gênero de super-heróis, mas o resgata de si mesmo. Ao abandonar o espetáculo grandioso e investir na simplicidade, no erro e na dor, o filme oferece algo que a Marvel vinha perdendo: humanidade. Talvez, ao olhar para os desajustados, o estúdio finalmente tenha reencontrado seu rumo.