Lançamentos da Semana: O Assassino e Five Nights At Freddy’s – O Pesadelo Sem Fim

O Assassino (David Fincher, 2023)

Autor: Jean Werneck

Em mais um parceria com a Netflix, David Fincher traz thriller sobre um assassino frio e inescrupuloso.

Fincher é conhecido por suas obras tensas e sofisticadas que compenetram o público (entre os mais famosos, Clube da Luta e Garota Exemplar). O Assassino, mais novo longa do diretor, acompanha um matador de aluguel sistemático correndo contra o tempo pra garantir sua segurança e a de sua família após um assassinato encomendado que deu errado.

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Adaptado da graphic novel homônima, a produção tem uma direção metódica e é dividida em cinco partes que mantém a estrutura literária básica. Somos introduzidos ao primeiro ato emblemático e observador que beira o estilo do voyeurismo e apresentados a esse protagonista evasivo e impessoal através da narração em off. Assim, passamos a acompanhar de perto como funciona o mecanismo racional por trás desse ser humano sem humanidade. Da mesma maneira, Fincher utiliza a intensa trilha sonora dos fones de ouvido do personagem – composta em sua maioria por músicas do The Smiths e sua perspectiva da vida da classe média inglesa dos anos 80/90 – para contrapor com as barbaridades que ele comete. Há um paralelo entre a visão do psicopata e a visão do público, o que permite que não sejamos cúmplices dele, mas apenas espectadores.

Ademais, é na exímia performance apática de Michael Fassbender e o desenvolvimento de seu arco dramático que O Assassino chama atenção. É um filme sobre a obsessão de liquidar as consequências do fracasso e a imaturidade ao lidar com ele. Muitos dos psicopatas trazidos pelo cinema – como em Onde Os Fracos Não Tem Vez ou O Abutre – se sobressaem por sua execução perfeita e detalhada, entretanto, aqui o protagonista é complexo por seus deslizes e a impiedade consigo mesmo em assumi-los. Isso traz cenas fantásticas, como a interação entre o assassino e a assistente do contratante, a cena de ação violenta entre os dois matadores de aluguel e a aparição de Tilda Swinton com uma morte cinicamente degustativa.

As pinceladas de crítica social dão o acabamento reflexivo sobre a vida descartável do século XXI e os parâmetros amorais pragmáticos de nossa sociedade. Esse assassino faz parte da massa que consome McDonald ‘s ou Starbucks e aparenta ser só mais um entre a maioria. São os pequenos detalhes, que acabam se tornando grandes por sua força narrativa e tornam O Assassino um dos melhores filmes do ano.

O Assassino (David Fincher, 2023)

Autora: Carol Ballan

David Fincher talvez esteja na lista de diretores mais prolíficos de sua geração, pelo menos nos Estados Unidos, sendo que provavelmente Hong Sang-soo passa a sua marca na Coréia do Sul. Entre clipes, longas, séries e animações, pode-se dizer também que ele possui uma grande versatilidade de conteúdo. Ainda assim, é difícil dissociar a sua imagem de thrillers, com alguns de seus grandes sucessos sendo Seven – Os Sete Crimes Capitais (1995), Clube da Luta (1999), Zodíaco (2007) e A Garota Exemplar (2014), além de mais recentemente a série Mindhunter (2017-2019), que o apresentou para uma nova geração de público.

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Seu estilo de filmagem já tem algumas características específicas, principalmente quando pensamos sobre seus longa-metragens. A precisão de câmera e roteiro, o uso de ângulos mais abertos e suas cores dessaturadas para reforçar o desconforto são algumas de suas marcas registradas, além de um forte controle de luz, gerando sombras proeminentes e planejadas. Todas essas características estão presentes em O Assassino, sendo fácil identificar sua autoria apenas com alguns frames. O uso de uma história e roupagem noir

O Assassino é uma história passada em primeira pessoa, acompanhando a saga de um assassino (Michael Fassbender) após um ataque de desconhecidos à sua esposa após sua falha em uma missão. Adaptado de uma história em quadrinhos escrita por Matz e ilustrada por Luc Jacamon, este era um projeto antigo de Fincher e que parece um reforço de diversas narrativas outrora contadas por ele. A mistura da ação com uma espécie de assassino serial meticuloso combina com suas decisões anteriores. De certa forma é possível até estabelecer uma relação com a meticulosidade do próprio diretor, conhecido pelas longas filmagens com muitos takes e altamente planejadas.

Fassbender consegue manter a atenção dos espectadores pelas quase duas horas de filme, ainda que a maior parte da narrativa se passe apenas na sua cabeça, usando o recurso de narração em voice over que só se torna irritante do meio para o final do filme. Nas cenas em que precisa contracenar com outros personagens, que raramente são nomeados, sua atuação é ainda mais impressionante pela sua total inabilidade de comunicação. Acreditamos perfeitamente em seu personagem, em sua frieza ilimitada e até em suas habilidades inesperadas. E também há atores sensacionais com os quais ele contracena, de Tilda Swinton a Arliss Howard. Para os fãs brasileiros, no entanto, a participação de Sophie Charlotte é bem breve – o que acontece em um momento ruim, dado o seu sucesso como Gal nos cinemas do país.

A maior dificuldade da obra está em manter o espectador interessado em seu andamento, dado que a fórmula de encontrar, perseguir e matar se torna cansativa a partir da segunda ou terceira vez que é mostrada na tela. Ainda que o personagem criado seja interessante, a falta de um histórico ou compreensão de como ele chegou até aquele ponto deixa a sensação de que faltam peças para que possamos compreender o quebra-cabeças criado por Fincher. Até as idiossincrasias do personagem, como o uso de luvas nitrílicas pretas, ou o ato de nunca dormir em camas, parecem um pouco deslocados exatamente pela narração excessiva, mas que ignoram esses detalhes.

Temos uma obra com uma temática interessante, mas que a todo momento parece não conseguir alcançar o seu potencial completo. A parceria entre Nolan e Fassbender é excelente, mas falta um elemento de inventividade que está sempre presente no cinema do diretor. É um filme fácil de assistir, ainda que apresente muita violência, mas que não tem uma característica tão marcante como alguns dos filmes mais inspirados do diretor.

Five Nights at Freddy’s – O Pesadelo Sem Fim (Emma Tammi, 2023)

Autora: Carol Ballan

Um projeto que levasse às telas a febre que foi Five Nights at Freddy’s é um assunto que circulava há muito tempo. Entre a compra dos direitos pela Blumhouse e o filme Willy’s Wonderland e seu roteiro extremamente parecido com o do jogo, muitos anos se passaram e muita mitologia foi criada pelos próprios desenvolvedores. Mesmo assim, nada preparava para o que seria esse filme.

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Para quem não joga videogames, é importante explicar o que é o jogo. FNAF, como é conhecido em abreviação, brinca com a antecipação do susto e o susto em si. Com poucas informações, começamos como um guarda noturno que está em seu primeiro dia em um trabalho novo, e recebe uma única dica de como fazer esse trabalho: não encontrar com os assustadores animatrônicos que podem ser violentos. As únicas ações que você pode ter são acender uma luz, checar as câmeras de segurança e fechar as portas. O objetivo, obviamente, é sobreviver às cinco noites de trabalho. Com isso, ele trabalha com a experiência de antecipação de levar um susto, e geralmente consegue atingir o objetivo. Mas a partir dessa pequena produção indie se iniciou uma legião de jogos, livros, vídeos analisando o jogo, até chegar a esse filme. A história da pizzaria foi se tornando gigantesca, e o bom uso de easter eggs foi gerando uma base de fãs gigantesca.

De certa forma, o filme respeita a maior parte da mitologia criada até o momento. O maior problema é que, sem o fator de imersão de estar jogando, o roteiro se torna absurdo demais. Entre a enorme quantidade de informações passadas nas quase duas horas, são resumidos anos de fãs se juntando para tentar compreender os pequenos segredos espalhados por diversas mídias. E quando esse envolvimento não consegue ser alcançado, a parte mais interessante da experiência do jogo se perde. Toda a informação precisa ser compactada e passada através de falas extremamente artificiais e explicativas.

Além disso, os sustos, outra das marcas registradas do jogo, não conseguem ser bem sucedidos. Ao contrário da maestria que o produtor Jason Blum tem ao criar o clima de suspense e fazer o espectador pular da cadeira, nem o áudio nem o visual conseguem empolgar o espectador. Eles decidem também não mostrar quase nenhuma situação de violência no longa-metragem, o que funciona contra sua lógica porque, sem conseguir dar o susto, não há nenhuma recompensa.

Então, ainda que se utilize o visual estranho dos jogos e tente manter o seu clima, é realizada uma adaptação fiel que não consegue funcionar como filme. As falas carregadas, a má direção de elenco e as decisões criativas priorizam apenas a fidelidade, e não a experiência. Possivelmente os fãs mais aplicados do jogo até irão gostar de como essa adaptação foi realizada, mas quem vai pelo conteúdo audiovisual com certeza se frustra.

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