Amigos Imaginários (2024, EUA e Canadá)
Texto por: Jean Werneck
Título Original: If
Direção: John Krasinski
Roteiro: John Krasinski
Elenco principal: Calley Fleming, Ryan Reynolds, John Krasinski, Phoebe Waller-Bridge, Fiona Shaw, Steve Carell e Louis Gosset Jr
Distribuição brasileira: Paramount Pictures
Duração: 104 minutos
Entre os desafios reais e imaginários do crescimento, John Krasinski mescla comédia e fantasia com uma nostalgia genérica.
E se um dia, aleatoriamente, você passasse a enxergar todos os amigos imaginários das crianças e recebesse a missão de fazê-las se lembrar deles na vida adulta? É isso que acontece com Bea (Cailey Fleming), uma pré-adolescente que embarca nessa aventura mágica enquanto se pressiona para crescer e deixar a inocência da infância para trás.
Diretor, roteirista, produtor e ator de Amigos Imaginários, John Krasinski realiza diversas funções nos bastidores do filme. Essa quase onipresença dele no desenvolvimento de seus longas foi bem sucedida na franquia de terror Um Lugar Silencioso, na qual Krasinski desbrava um pouco de sua assinatura com o cinema de autor. Contudo, a estética cinematográfica americana padrão e a atmosfera semelhante a outros clássicos do gênero da fantasia - como Marry Poppins (1964) ou Alice no País das Maravilhas (1951) - tornam o novo projeto de Krasinski uma fórmula pronta encomendada pela Paramount como uma aposta de arrecadação de bilheteria do estúdio para os pais levarem os filhos aos cinemas e contemplarem uma típica sessão da tarde nas férias.
Veja, não há problema nenhum com fantasias água com açúcar que nos imergem em mundos fictícios para aprendermos lições sobre o mundo real - eu mesmo sou fã de Julia Andrews cantando Supercalifragilisticexpialidocious e da animação da Disney -, mas se trata de um modo de contar histórias um tanto quanto batido no cinema. A ideia de representar os Migs como figuras que surgem de necessidades reais das crianças a serem preenchidas é um tanto quanto emocionante, mas, novamente, peca pela falta de originalidade ao trazer uma moral da história similar à explorada pela franquia Toy Story, que trata do desapego da criança com a identidade lúdica construída por suas brincadeiras na infância. Mesmo assistindo Amigos Imaginários pela primeira vez no cinema existe a sensação de estarmos reprisando experiências que já tivemos com outros filmes antes. É possível até prever o plot-twist do final caso você tenha um repertório minimamente vasto.
Ademais, o problema não está só na reprodutibilidade da essência de narrativas familiares como essa como também na neutralidade da parte técnica. Não é que não exista uma trilha sonora sentimental ou efeitos especiais convincentes compondo a artificialidade dos personagens em CGI, mas a reação gerada no espectador é um tanto quanto neutra por se tratar de escolhas estilísticas ou formas imagéticas produzidas centenas de vezes no cinema hollywoodiano. A exceção da cena musical no asilo para os Migs, que tem uma decupagem bem dinâmica e inventivamente coreografada por Mandy Moore (La La Land e Babilônia), todas as outras cenas afundam nos trocadilhos infames que tentam arrancar sorrisos do público a todo custo. Pode alcançar o humor de algumas pessoas - como quem estava ao meu lado e deu altas gargalhadas - e também pode não alcançar o humor de algumas outras que vão passar boa parte do longa se perguntando se era para ser engraçado ou não.
Por fim, Amigos Imaginários pode enfrentar o mesmo problema de seus personagens e ser esquecido com o tempo pelo público infantil que o assistiu. Caberá só a Bea junto ao palhaço Cal (Ryan Reynolds) correrem para nos lembrar que este filme não foi fruto da nossa imaginação, mas de fato existiu em um passado remoto.
Back to Black (2024, França, Reino Unido e Inglaterra)
Texto por: Carol Ballan
Título Original: Back to Black
Direção: Sam Taylor-Johnson
Roteiro: Matt Greenhalgh
Elenco principal: Marisa Abela, Eddie Marsan, Jack O’Connell, Lesley Manville, Juliet Cowan e Sam Buchanan
Distribuição brasileira: Universal Pictures
Duração: 122 minutos
Ainda que a vida de Amy Winehouse tenha tido altos e baixos, uma dose considerável de sofrimento e tenha se encerrado muito cedo, algo impossível de dizer é que ela foi monótona ou facilmente compreensível. Com temáticas de luto, vício em drogas, relacionamentos abusivos e o poder da arte como sintetizadora de emoções, existiam milhares de caminhos possíveis para finalmente retratar a cantora em tela. Infelizmente, para este filme, foram escolhidos todos os caminhos intermediários e se gerou mais uma obra que oculta ao máximo qualquer polêmica para fingir uma isenção impossível.
A falta de um recorte temporal é um dos elementos que incomodam: passam-se quase 10 anos da vida de Winehouse em tela em apenas duas horas, sem foco específico e gerando apenas uma informação sobre fatos de sua vida. Com tal quantidade de fatos a serem cobertos, não é à toa que todos eles parecem pouco relevantes, chegando a um final trágico já esperado sem nenhum impacto. Isso não é ligado à atuação de Marisa Abela, que mostra um esforço hercúleo para trazer a personalidade real para a personagem em tela. Superado o estranhamento inicial com sua voz, para quem é fã da cantora, por muitas vezes é possível até esquecer que se trata de uma encenação.
Se torna uma questão latente pensar em como tratar uma obra de ficção que tenta retratar a realidade. Claro, são necessários recortes, mas mais do que isso, é necessário pensar em qual a mensagem que se deseja passar com o filme, mais do que qual a bilheteria esperada. Existem cinebiografias que conseguem ultrapassar essa barreira apenas mercadológica, como Rocketman e sua celebração à vida fantástica de Elton John, ou Spencer e seu retrato claustrofóbico de uma mulher oprimida dentro da nobreza. Mas, como em tantas outras obras genéricas do gênero, aqui não há nenhuma mensagem, positiva ou negativa, a ser transmitida pela vida da cantora. Ele se inicia e se encerra com uma frase creditada a Winehouse de que ela gostaria de ser lembrada pela sua voz - mas ela é sufocada durante toda a duração do longa-metragem.
Se sua estética e seu estilo estão muito bem representados, é na profundidade que ele peca. Ao invés de tentar criar um retrato humano de uma mulher que sofre com a separação dos pais, com uma noção de amor distorcida e com uma necessidade de aceitação que a leva a extremos, simplesmente se mostra uma garota ingênua, influenciável e apaixonada. O que é tão interessante no documentário feito anos antes sobre Amy é justamente revelar que nenhum dos personagens importantes em sua vida era simplesmente preto no branco. Seu pai, por mais que tenha auxiliado em momentos de recuperação, também abusou da imagem pública da filha para atrair atenção e dinheiro. Seu ex-marido, apesar de amá-la, não percebia o quanto ele mesmo era viciado e poderia lhe fazer mal. Os paparazzis, sempre presentes, também estavam ali por uma demanda de notícias de uma mentalidade doente que gostava de ver celebridades humilhadas até seu último fio de cabelo.
Assim, mesmo que o filme faça um trabalho razoável em juntar uma linha do tempo e intercalar com boas interpretações de suas músicas, ele erra completamente ao não entender a essência da história que deseja contar. Ele acaba se tornando apenas mais um projeto de estúdio que será facilmente esquecido e que passa muito longe da grandiosidade de Amy Winehouse.
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