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Foto do escritorCarol Ballan

Crítica | Avenida Beira-Mar

Avenida Beira-Mar (Brasil, 2024) 


Título Original: Avenida Beira-Mar

Direção: Maju de Paiva e Bernardo Florim

Roteiro: Bernardo Florim e Maju de Paiva

Elenco principal: Andrea Beltrão, Emiliano Queiroz, Isabel Teixeira, Analú Prestes, Milena Pinheiro, Milena Gerassi, César Augusto e Daniel Breda

Duração: 92 minutos

Distribuição brasileira: Elo Studios


Era raro no Brasil a criação de filmes coming of age, ainda mais considerando a interseccionalidade com questões de gênero ou sexualidade. Isso se dá tanto por conta da multiplicidade das infâncias brasileiras, que dependem de fatores socioeconômicos tanto quanto de afetivos, em um país que há pouco tempo elegeu um governo de extrema-direita. Ao mesmo tempo, há uma crescente de filmes que tratam de jovens LGBTQIAPN+ neste momento de transição para a adolescência, criando uma cinematografia extensa que vai de Alice Júnior (2019) a Sem Coração (2023).


as duas atrizes milena em patins na avenida beira mar

Avenida Beira Mar vai neste mesmo caminho ao mostrar a amizade entre duas garotas, Rebeca (Milena Pinheiro) e Mika (Milena Gerassi). Rebeca é uma garota solitária que acabou de se mudar para Niterói com a mãe, e que está acostumada à solidão por ter que cuidar da mãe que passa por altos e baixos de uma doença. Mika, por outro lado, vive a solidão de uma menina trans não aceita pelos pais e que luta diariamente para existir. Juntas, ambas percebem que a vida não precisa ser uma experiência tão solitária quanto inicialmente achavam.


A obra segue um clima de drama intimista ao apresentar as duas garotas aos poucos se conhecendo e aprendendo a compartilhar um pouco de sua existência que, apesar de bastante distantes, criam um laço justamente por conta dessa falta de um acolhimento adulto forte. Com uma maioria das cenas acontecendo em espaços fechados ou isolados, o longa-metragem acaba se desenvolvendo a partir de ações e falas entre as duas e pessoas ao seu redor, que com a nossa visão como público se expandindo na mesma medida em que a visão de mundo das duas garotas também expande. Cria-se uma forte dualidade entre as cenas internas, que causam sempre um sufocamento, seja por elas estarem em locais proibidos ou onde se sentem desconfortáveis e as externas, onde patinando ou indo à praia, há uma grande sensação de liberdade.


A fotografia do longa-metragem ajuda a contar essa história mais intimista, focando em quadros mais fechados e até em zooms de partes de corpo como pés e mãos, criando essa sensação de proximidade. Com isso, ganha-se mais profundidade no aspecto audiovisual, mesmo que em alguns momentos os diálogos sejam excessivamente expositivos.

O que realmente dá uma personalidade única ao filme é a escalação das atrizes que fazem os papeis principais, Milena Pinheiro e Milena Gerassi. Pinheiro consegue transmitir apenas no gestual algumas de suas experiências como uma garota negra, enquanto a vivência de Gerassi como pessoa trans também ajuda na construção e vivência de sua personagem. É óbvio que suas experiências pessoais transparecem em cena, e geram também uma camada extra de aprofundamento no filme. Isso se mescla à experiência de atores mais experientes e cria também um significado, desta nova geração de pessoas que está começando a aparecer no cinema nacional - assim como é o caso dos diretores, que estão dirigindo seu primeiro longa.


Assim, mesmo que a obra tenha algumas irregularidades em seu caminho que são comuns a um longa-metragem de estreia dos diretores, a somatória é uma experiência afetiva profunda, que ajuda na conexão com realidades não necessariamente próximas às dos espectadores. É um momento feliz para o cinema nacional que essas histórias possam estar sendo produzidas, distribuídas e assistidas, além de premiadas dentro e fora do país. Que a multiplicidade do Brasil possa tornar cada vez mais histórias viáveis dentro do nosso cinema.


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