Os Fantasmas Ainda Se Divertem (EUA, 2024)
Título Original: Beetlejuice Beetlejuice
Direção: Tim Burton
Roteiro: Alfred Gough, Miles Millar e Seth Grahame-Smith
Elenco principal: Michael Keaton, Winona Ryder, Catherine O’Hara, Jenna Ortega, Justin Theroux, Willem Dafoe e Monica Bellucci
Distribuição brasileira: Warner Bros.
Duração: 104 minutos
Imagine a situação: você é um diretor razoavelmente iniciante, com uma estética pouco usual e que, além de alguns curta-metragens, só dirigiu um longa, baseado em um personagem infantil. Então, um projeto de comédia sobrenatural cai no seu colo, e acaba sendo a sua porta para um duradouro sucesso. Agora, mais de 30 anos depois disso, você fez de tudo. De projetos menores como Ed Wood a colaborações com a megacorporação Disney em Dumbo, de animações icônicas como A Noiva Cadáver até projetos esquecidos como O Planeta dos Macacos. E suas últimas entrevistas tinham sido pessimistas, falando sobre a perda da alegria em fazer cinema. Então, quando um projeto como Os Fantasmas Ainda Se Divertem aparece, essa pode ser uma grande chance de voltar a ter controle de sua carreira de maneira mais positiva.
Uma longa vida trabalhando com diversos atores excelentes acabou compensando, até porque o casting original, que retorna em peso no novo projeto, é excelente por natureza. Mas, com um ótimo olhar para além da obra, as adições feitas também são bem vindas e trazem o frescor que o filme precisava. Aqui, estamos lidando com uma Lydia (Winona Ryder) adulta e sua relação com a filha Astrid (Jenna Ortega). Espetacularmente matando o ator do casting original que cometeu crimes sexuais, o filme lida com a relação entre três gerações da família, pois não podemos esquecer da madrasta Delia (Catherine O’Hara) quando acontece essa perda. E, pelo lado sobrenatural, Lydia está apavorada por estar voltando a ver Beetlejuice (Keaton) em diversos lampejos.
A primeira coisa que a obra faz é lidar com o filme anterior. Deixar claro quais personagens retornam e quais não, como Lydia lidou com a sua habilidade de enxergar fantasmas na vida adulta, e igualmente importante, como é o futuro na adolescente gótica criada nos anos 1980. Então, ele consegue adicionar uma camada de algo novo com Astrid, que tem um certo desajuste semelhante ao da mãe, mas que se encontra do outro lado do espectro, completamente intelectual e racionalizada. Se essa diferença não é suficiente para falar sobre quanto o mundo mudou, ainda há uma clara mudança no comportamento de Beetlejuice, agora um vilão empreendedor, mas que, lá no fundo, morre de amores pelo amor perdido. Sem mudar muito a fórmula do filme original, mas adicionando essa relação familiar amadurecendo, é importante lembrar que muitas novas ideias são colocadas em prática e que algumas funcionam melhor que outras. Por exemplo, a inclusão de Delores (Monica Bellucci) é claramente apenas um gancho narrativo, mas sua primeira cena, se montando entre as diversas caixas que guardam seu corpo, é tão incrivelmente sensual e estranha (ao melhor estilo de Burton) que a escolha funciona para o filme.
Há momentos constrangedores, como a piada que vai longe demais em relação ao Soul Train ou a piada envolvendo o asiático dono da lavanderia. Mas eles acabam sendo levados para a sombra pelos momentos em que a criatividade de Burton brilha, com o uso de bonecos, efeitos especiais oitentistas e cenas com músicas que funcionam como o alívio cômico perfeito. A alegria de todos pelo projeto transparece nas telas, e como fã declarada do diretor, é feliz poder assistir a uma obra que parece retomar o seu amor pelo cinema.
É claro que é difícil saber qual o espaço do Tim Burton em um mundo que mudou tanto, mas receber essa sequência nostálgica e divertida é um aceno para dias melhores para a sua carreira.
Hellboy e o Homem Torto (EUA, Reino Unido e Alemanha, 2024)
Título Original: Hellboy: The Crooked Man
Direção: Brian Taylor
Roteiro: Christopher Golden, Mike Mignola e Brian Taylor
Elenco principal: Jack Kesy, Jefferson White, Joseph Marcell, Leah McNamara, Adeline Rudolph, Martin Bassindale, Nathan Cooper e Hannah Margetson
Distribuição brasileira: Imagem Filmes
Duração: 99 minutos
Dentro do universo que são as adaptações de quadrinhos para o cinema, Hellboy é um personagem com um histórico peculiar. Ainda em 2004, quatro anos antes do lançamento marcante de O Homem de Ferro e toda a subsequente febre da Marvel, foi lançado o seu primeiro filme dirigido por Guillermo del Toro, e apesar de ter um certo sucesso com crítica e público e até uma continuação, elas caíram em um nicho por terem sido lançados antes de o público se acostumar com o universo das adaptações de HQs. Foi feito então uma sequência posterior, em 2019, que conseguiu ser um fracasso tanto com público quanto com a crítica. Este filme, consequentemente, é importante para a indústria pensar se haverá ou não a manutenção da franquia.
Assim, o próprio criador do personagem, Mike Mignola, é colocado dentre os roteiristas, pensando em algo capaz de agradar os fãs de quadrinhos. O que talvez não tenha sido pensado é que esse público muitas vezes não gosta tanto assim de quadrinhos, mas sim de adaptações cheias de cenas de ação muito bem feitas e uma boa narrativa de bem contra mal. Digo isso porque o longa-metragem parece bastante com um arco de quadrinhos, mas que infelizmente só funcionaria pelo conhecimento prévio do personagem principal e a psicologia por trás dele, sendo essa apenas uma história que ajudaria a desenvolver essa questão maior.
O filme já se inicia no meio da ação, quando Hellboy (Jack Kesy) e Bobbie Jo (Adeline Rudolph) estão levando uma caixa desconhecida de um ponto para outro nos Estados Unidos, que rapidamente se revela uma aranha possuída. Então, seguimos com eles na aventura de encontrar o aracnídeo paranormal em uma cidade no meio do nada e que, convenientemente, está passando por uma situação que o investigador paranormal pode ajudar a resolver.
A questão de iniciar o filme em meio a uma ação pode ser excelente para a narrativa, criando um primeiro momento de tensão e depois apresentando melhor os personagens e situações organicamente. Apesar de Hellboy tentar fazer isso, infelizmente ele não consegue, já perdendo os espectadores nas primeiras cenas com um CGI pavoroso da aranha. Mais do que isso, o filme também falha em apresentar as relações entre personagens e suas histórias prévias, por exemplo, em relação a todo o drama de maternidade de Hellboy que é importante para o personagem, mas que aparece no filme com destaque sem que os espectadores saibam dessa importância. É significativo que ele esteja lutando contra uma bruxa, só que o espectador casual, que não conhece muito o personagem, não tem acesso a essa simbologia através dessa obra audiovisual a não ser pela fala explícita, que pode funcionar nos quadrinhos, mas não no cinema.
Esse problema também acontece com todo o resto do filme. A edição e fotografia se misturam em cenas que parecem saídas de páginas de quadrinhos, mas que não são tão impressionantes nas telas. Usa-se todo um folclore específico e significativo, mas que perde parte do seu charme pela necessidade de continuar se explicando continuamente. Talvez compreender melhor a linguagem fílmica e diminuir a quantidade de elementos, criando cenas mais elaboradas e bem coordenadas tivesse um efeito maior do que a inclusão de três personagens como simples intermediários para o vilão.
Nesse momento, as chances para a continuação deste universo extremamente grandioso no cinema são mínimas. Uma grande perda, pois um pouco de aventura sobrenatural em um tipo de filme que está buscando cada vez mais um realismo impossível seria muito bem-vinda.
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