Placa-Mãe (Brasil, 2023)
Título Original: Placa-Mãe
Direção: Igor Bastos
Roteiro: Igor Bastos
Elenco principal: Áurea Baptista, Guilherme Barcellos, Keka Bittencourt, Marcello Crawshaw, Carlos Cunha e Stevan Gaipo
Distribuição brasileira: 02 Play
Duração: 105 minutos
Animação nacional discute as novas configurações familiares por meio da ficção científica e valorização do cinema regional.
Nadi (Ana Paula Schneider) é a primeira andróide a conquistar a cidadania em uma metrópole futurista de Minas Gerais. Depois de conhecer os irmãos Lina (Ana Júlia Silva Guimarães) e David (Vitor Gabriel Pereira), ela luta pelo direito de adotá-los enquanto lida com o preconceito social.
Desde que O Menino e o Mundo foi indicado ao Oscar de Melhor Animação em 2016, o cenário para os animadores brasileiros tem mudado. Uma matéria do portal Correio Braziliense aponta que o mercado brasileiro de animação tem aumentado seu alcance internacional, destacando Perlimps — longa animado de Alê Abreu que sucedeu O Menino e o Mundo — e Chef Jack: O Cozinheiro Aventureiro — a primeira animação longa de Minas Gerais — como expoentes desse movimento. Entretanto, o gênero animado dentro do cinema nacional continua lutando por investimentos e espaços nas salas de cinema ao lado de animações estrangeiras. Mais um passo nessa empreitada, Placa-Mãe chega aos cinemas de rua e de franquia discutindo temas atuais enquanto reforça a identidade brasileira e, mais especificamente, a mineira.
O senso identitário de Placa-Mãe é um dos pontos altos da produção que conecta o público com seu estilo e autenticidade. Desde a música tema "Paula e Bebeto", de Milton Nascimento, até outras famosas canções nacionais que compõem a trilha sonora do longa, a obra destaca suas raízes culturais como seu diferencial em relação a outros projetos do gênero. Claro, adoção, preconceitos sociais e inovações tecnológicas não são questões localizadas e unicamente pertencentes ao espaço em que a narrativa se ambienta. Contudo, o diretor encontra um jeito de imprimir o DNA de suas origens nesses debates universais, usando gírias regionais como "uai" ou "trem" e levando os personagens para passear no trem Maria Fumaça e comer pão de queijo como símbolo de sua união.
Ademais, a parte técnica deixa a desejar. Apesar da bela animação em 2D com traços artesanais que fogem do 3D realista e artificial que domina o gênero, Placa-Mãe apresenta baixa qualidade de áudio na dublagem, além de alguns dubladores que carecem de entonação ou expressividade, algo essencial nas animações. Podemos considerar que isso é consequência dos desafios que as animações brasileiras enfrentam em sua produção, como baixo orçamento ou cronogramas de pré-produção instáveis; contudo, não dá para negar o quanto isso afeta o resultado final.
Placa-Mãe ainda estende seu enredo mais do que o necessário, criando o clichê do mal-entendido entre os personagens como clímax próximo ao desfecho, quando David entende, por uma conversa pela metade, que Nadi ficaria com apenas um dos irmãos. Por outro lado, enriquece a narrativa ao não colocar o contexto social adverso como única antagonista da relação entre Nadi, Lina e David, ressaltando como a adaptação ao processo de adoção pode ser difícil, apesar de belo.
No mais, o longa parte da distopia do futuro para abordar direitos civis com enfoque na formação de novas configurações familiares. Carros voadores, a evolução da inteligência artificial e a humanização dos andróides antropomórficos se tornam ganchos para discutir a cidadania de determinados grupos minoritários em termos jurídicos. Isso tudo com uma pegada pedagógica e lúdica para a audiência infantil, mas de modo que também converse com uma audiência adulta.
Por fim, entre o macroambiente do mercado das animações nacionais e suas particularidades narrativas e técnicas, Placa-Mãe supera os obstáculos burocráticos do audiovisual nacional e se orgulha de ser uma obra brasileira sobre histórias brasileiras.
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