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Foto do escritorCarol Ballan

Crítica | Saideira

Saideira (Brasil, 2024)


Título Original: Saideira

Direção: Pedro Arantes e Júlio Taubkin

Roteiro: Arthur Warren, Júlio Taubkin e Marina Morais

Elenco principal: Luciana Paes, Thati Lopes, Rogério Fróes, Suely Franco, Ary França, Jackson Antunes e Tonico Pereira

Distribuição brasileira: Elo Studios

Duração: 112 minutos


Além de motivo de canções e unificadora de multidões, a cachaça é considerada um patrimônio cultural brasileiro desde 2016. É acertada então a decisão de colocá-la no centro de uma narrativa de comédia familiar como elemento para aproximar duas irmãs que perderam contato.


duas irmãs viajam em carro em cena do filme saideira

Em um começo ousado para o gênero, rapidamente conhecemos Honório (Tonico Pereira), um senhor carismático que vende garapa de cana em Paraty, e já logo somos interpolados pelo seu falecimento. É apenas no seu velório que a verdadeira narrativa se inicia, com o encontro entre as irmãs Penélope (Luciana Paes) e Joana (Thati Lopes) após muitos anos. Não entendemos, neste momento, as razões para todas as farpas trocadas, mas por ser uma dinâmica familiar comum, também não se questiona o desentendimento. É apenas quando a herança do avô é anunciada que a real briga se inicia: um dos itens é uma cachaça raríssima, sendo que Penélope é uma renomada cachaçóloga. Mas o presente também revela uma busca pela garrafa de cachaça em si, e as irmãs seguem em um road movie pelo Sudeste brasileiro em busca do tesouro.


Começando em Paraty, a escolha dos cenários é indubitavelmente um dos elementos mais marcantes da obra, passando também por Tiradentes, São Thomé das Letras e Itabira. Todos são parte de um sudeste não muito explorado pelo cinema, mas obviamente muito importantes para a história e cultura brasileiras. Além disso, pelas escolhas de direção e direção de fotografia, valoriza-se ainda mais cada um desses lugares, das rampas da cidade mineira até o show de luzes na mística São Thomé das Letras. Viajamos pelo nosso próprio país de maneira pouco explorada até pelo cinema comercial.


Isso é complementado pela narrativa que vai se mostrando em camadas, iniciando com apenas a busca por uma garrafa de cachaça que acaba se tornando uma reflexão conciliatória entre duas irmãs que perderam parte da infância com a morte dos pais e a tutela do avô alcoólatra. Ele segue sempre pelo permeio da comédia, sem exagerar na dramaticidade, mas colocando a importância do contexto para a criação das situações apresentadas. E também dá ao espectador um motivo para reflexão e recordação do filme quando as risadas passam.


O tom de humor utilizado também é mais incomum. Temos diversas piadas pesadas com a morte de Honório, algo que pode ser visto com maus olhos pelos mais conservadores mas que é completamente justificado na narrativa. Há também algo de humor nonsense, principalmente nas partes de São Thomé das Letras, e isso se destaca gerando uma possibilidade mais ampla de público.


Todos esses elementos não funcionariam caso atrizes menos talentosas tivessem sido escaladas, mas Paes e Lopes fazem uma dupla que consegue segurar tanto as cenas de humor quanto as mais dramáticas. Ainda que haja algumas cenas excessivamente explicativas, o carisma da construção das personagens permite que não se desligue do filme. Principalmente com o humor mais peculiar de Penélope, o casting é um ponto essencial e extremamente funcional. Mesmo os personagens mais secundários funcionam de forma a questionar o humor estruturalmente machista da comédia nacional, como na cena em que as irmãs entram em um bar e se inicia uma luta de palavras com o dono do local.


O resultado é um longa-metragem que consegue trabalhar bem as convenções de gênero e que, através dessas personagens cativantes, permite uma reflexão sobre as nossas estruturas familiares de maneira sutil. Uma boa adição ao cenário das nossas comédias recentes.


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