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Diversos

Críticas | Godzilla x Kong: O Novo Império e O Homem dos Sonhos


Godzilla x Kong: O Novo Império (Adam Wingard, 2024)


Texto por: Adam William

Quando o assunto é cinema hollywoodiano, é cada vez mais comum que parte do público separe o que é "cinema de arte" de um "simples entretenimento". Neste caso, há quem diga que o ideal é desligar a mente para aproveitar melhor algumas obras. E tudo bem. Afinal, o entretenimento pode e deve ser suficiente, o que não significa que isso seja argumento para blindar um filme – ou qualquer forma de arte – de um olhar mais detalhado. Assim, embora Godzilla x Kong: O Novo Império (Godzilla x Kong: The New Empire) seja o tipo de filme onde o esperado é uma diversão praticamente vazia, alguns problemas se destacam a ponto de incomodar quem só queria ver uma boa briga de monstro gigante. O cinema de Steven Spielberg e Guillermo Del Toro, por exemplo, deixa claro que o entretenimento pode ser escapista e ao mesmo tempo trazer uma direção ou um roteiro com qualidade inquestionável.

Bom, o fato é que Adam Wingard, responsável por Godzilla x Kong não é nenhum Spielberg. Seu filme de monstro está mais focado em colocar os icônicos kaijus – termo japonês para as criaturas gigantes – para brigarem, sem pensar muito a respeito disso. O espectador desavisado que entrar na sessão sem esperar um comentário mais sagaz ao estilo de Godzilla: Minus One, e estiver mais interessado no bom e velho quebra-pau honesto, certamente vai encontrar uma boa dose de diversão. Mesmo que precise fazer certo esforço para ignorar problemas no roteiro, principalmente aqueles que têm origem no núcleo humano da história. Erro comum em obras do gênero, que insistem em tentar fazer com que o espectador se importe com os poucos humanos em um filme onde o show deveria ser dos monstros que dão nome à obra.


O núcleo humano dessa vez traz o retorno do trio formado por Rebecca Hall, Kaylee Hottle e Brian Tyree Henry, presentes no filme anterior, e conta com a adição de um novo personagem vivido por Dan Stevens. O grupo parte para investigar um sinal com origem na Terra Oca, atual lar de Kong, que foi enviado para lá pela organização Monarch a fim de evitar novos conflitos entre o gorilão e Godzilla. São personagens que se revelam cativantes o suficiente para não se tornarem um empecilho, mas ao mesmo tempo não parecem ter uma função narrativa clara. Por vezes, eles soam como artifícios para mastigar as explicações sobre aquela mitologia ou simplesmente trazer um alívio cômico que arranca uma ou duas risadas, mas que se torna esquecível dentro de todo o escopo criado pelo diretor.


Com a obra se passando majoritariamente no cenário fictício da Terra Oca, Wingard deixa claro que está bem à vontade para criar sequências de ação colossais sem o risco de se tornar um "destruction porn", tipo de filme que promove uma destruição generalizada com um valor estético exagerado e que, por um tempo, foi uma preocupação comum entre os filmes de super-heróis. Há set pieces isolados pensados para entregar ao espectador o quebra-pau esperado, com Kong enfrentando o vilão da vez – outro macacão chamado de "Rei Cicatriz", pois aparentemente não tinha algum roteirista para pensar em um nome melhor –, ou Godzilla enfrentando kaijus aleatórios em cidades como Roma – o que ao menos gera uma cena engraçada envolvendo o Coliseu –, mas há pouco que realmente empolgue. No receio de dar algum peso verdadeiro aos confrontos, Wingard cai para uma artificialidade que até os videogames já deixaram para trás.


Há inclusive duas surpresas negativas para uma experiência que poderia se garantir simplesmente na pancadaria livre: a primeira é o exagerado número de soluções improvisadas as quais o roteiro recorre – a "manopla do infinito" usada por Kong é um deus ex-machina safado –, e a segunda é o tempo de tela dos supostos protagonistas, que não apenas soa bem desequilibrado como peca por não aproveitar devidamente a dupla de kaijus que dão título ao filme. Caberia um pouco mais de cenas com os dois juntos, mas também uma lógica melhor para o uso do Godzilla, que parece narrativamente deslocado nos dois terços iniciais da obra. Não fosse a questão mercadológica, o filme poderia facilmente ser vendido como uma continuação direta de Kong: A Ilha da Caveira.


Existe um bom trabalho visual tanto no CGI das criaturas quanto na fotografia do filme. E as sequências de ação se garantem mais pelos personagens envolvidos do que necessariamente pela direção, o que não impede que Godzilla x Kong: O Novo Império soe como um produto saído de uma linha de montagem. Sem senso de aventura, o longa pode ser colocado lado a lado com qualquer Transformers mais recente, mas sem o apelo visual que fez dos filmes dos alienígenas robóticos uma febre no mundo inteiro. O resultado mal se garante na nostalgia, e nem é preciso pensar demais para perceber que o entretenimento aqui não é somente vazio – isso seria perdoável –, mas apático. E quando um filme envolvendo Godzilla e King Kong não consegue despertar mais do que uma risada rápida, é algo para se preocupar.



O Homem dos Sonhos (Kristoffer Borgli)


Texto por: Jean Werneck

Em novo filme da A24, Nicolas Cage vai de figurante à protagonista da própria história.

O medíocre Paul Matthews (Nicolas Cage), um professor universitário não realizado profissionalmente, alcança uma misteriosa fama ao aparecer nos sonhos de milhares de desconhecidos. Ao se tornar realidade, o fenômeno inexplicável dos sonhos transforma a vida de Matthews em um pesadelo. O Homem dos Sonhos é mais uma aposta da A24, estúdio de cinema cult que se popularizou nos últimos anos, para mais uma de suas curiosas premissas.

Para além do nome de peso de Nicolas Cage e da A24 como idealizadores do projeto, o longa chamou atenção desde sua pré-produção por suas peculiaridades intrigantes. O roteiro parte do evento canônico para abordar questões como a fama repentina - que reflete a maneira escapista e invasiva como a sociedade enxerga as celebridades - e as projeções sociais provenientes dessa exposição - às vezes intencional e às vezes não. Tudo deságua no embate dicotômico entre fama e reconhecimento para diferenciar o que Paul Matthews busca e o que ele realmente alcança ao ganhar essa visibilidade. Apesar da argumentação contundente nos dois primeiros atos, o roteiro reduz sua potência ao deixar de lado a discussão do subconsciente coletivo contra intuitivo para dar lugar a uma mensagem água com açúcar de desfecho. O amargor da ambição que não valoriza o que se tem, já tratada em tantos filmes, substitui o teor emblemático dos sonhos dos alunos e fãs obcecados de Matthews e as projeções disso trazidas para a identidade do mesmo.

Outrossim, a fórmula singularmente popular da A24 está presente estilisticamente e capta a atenção do espectador desde a primeira cena. O formato tem sido aclamado entre público e crítica, contudo tem deixado de ser cada vez menos singular para se tornar popular, levando o estúdio a buscar o equilíbrio entre o reconhecimento que o trouxe até aqui na mesma medida em que se deleita na fama alcançada. O Homem dos Sonhos condensa a base do formalismo característico do estúdio, mas não o expande como um todo. O longa acaba por ser assemelhar ao excelente Beau Tem Medo, outro trabalho da A24 lançado em 2023, em sua concepção cinematográfica, contudo explora menos criativamente o onirismo - um aspecto que precisa ser essencialmente tecido ao tocar o inconsciente dos sonhos. Não há uma imersão psicológica aprofundada - como já feita nos clássicos Cidades dos Sonhos e De Olhos Bem Fechados -, o que frustra diante de realizações mais robustas.


Logo, O Homem dos Sonhos não é o novo hit da A24, e sim mais um filme da A24. O que não o torna medíocre como seu protagonista, mas o torna menos criativo na filmografia de uma produtora que é marcada pela criatividade.


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