Mergulho Noturno (Bryce McGuire, EUA, 2024)
Quando pensamos na diferença entre um curta metragem e um longa metragem, apesar do tempo provavelmente estar no centro do que se pensa como diferença, toda a linguagem e o aprofundamento do roteiro geralmente são os elementos que tornam uma adaptação de curta em longa bem ou mal sucedida. Se o curta-metragem pode apresentar apenas uma ideia interessante e assustadora pelos seus minutos de duração, o longa precisará desenvolver contexto, personagens, histórico e trama com início, meio e fim para que espectadores saiam satisfeitos da sala de cinema (é claro que há exceções, mas estou tratando aqui de um filme convencional).
O curta-metragem que funciona quase como argumento para Mergulho Noturno, homônimo e cujo roteirista dirige agora o longa-metragem, funciona perfeitamente no seu universo. Como basicamente uma cena única, ele apresenta bem o desconforto da personagem principal em nadar à noite, e logo em seguida o justifica com seu desaparecimento.
Quando esse conceito é expandido, o filme começa com uma cena bem semelhante, mas melhor trabalhada na criação de tensão. Rapidamente vemos uma criança desaparecer na piscina, e o conceito principal da obra está estabelecido: existe uma assombração que mata pessoas na piscina. Cria-se então uma dinâmica de casa mal-assombrada já conhecida pelos fãs de horror: uma nova família compra a casa, tem que lidar com a assombração e tentar quebrá-la.
As cenas que envolvem a dinâmica de assombração são bem realizadas e conseguem criar um impacto visual forte. Algumas escolhas, como a de gravar alguns momentos do ponto de vista subjetivo e focando no momento em que os personagens estão saindo da água, na confusão entre o que está submerso ou não, por exemplo, vem do conceito do curta e consegue se desenvolver de maneira eficiente e assustadora. Também pensando no conceito de uma piscina infinita, todas as cenas que ocorrem nas profundezas são bem elaboradas.
A dificuldade principal do longa-metragem, e que faz com que ele acabe não conseguindo evoluir muito o conceito do curta, é em expandir a ideia para algo que faça sentido nos 100 minutos de filme. Começando pela família colocada na casa, há um elemento muito generalista e ao mesmo tempo extremamente estadunidense que torna a história ao mesmo tempo óbvia e afastada de públicos internacionais. Ainda que as atuações sejam esforçadas, elas são gastas com personagem tão estereotipados que tornam a narrativa muito previsível e pouco convincente, principalmente com Wyatt Russell no papel de Rat Waller, o ex-atleta profissional aposentado por doença e que faria tudo para ter novamente seus dias de glória. A dualidade entre seus filhos Izzy (Amélie Hoeferle) e Elliot (Gavin Warren) como a garota popular que naturalmente é boa em esportes e o garoto levemente desajustado também é muito antiquada, causando até certo constrangimento em quem assiste.
É triste que o filme encontre essa dificuldade em achar o seu tom e simplesmente seguir com ele, sentindo a necessidade de criar um subtexto para o público que apenas o atrapalha. O resultado é o desperdício genérico de uma boa ideia.
O filme está sendo distribuído no Brasil pela Universal Pictures. Verifique as sessões na sua cidade.
Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo (Maurício Eça, Brasil, 2024)
É difícil encontrar um brasileiro que não teve contato com os gibis ou desenhos da Turma da Mônica, projeto criado por Mauricio de Souza há mais de 60 anos. Hoje uma empresa gigantesca, com produção de gibis, mangás, graphic novels, canais de Youtube e produção de filmes, pode-se dizer que ela é muito influente na produção cultural do país. Não querendo perder a oportunidade de criar algo para o público adolescente, desde 2008 ela tem a linha Turma da Mônica Jovem, que aproveita as características do grupo de amigos quando criança para criar personagens mais velhos, em uma roupagem mais ligada aos mangás e trazendo, além das temáticas da adolescência como o crescimento e as mudanças da fase, temas mais sobrenaturais e tramas mais complexas, que podem durar mais do que uma edição.
Uma adaptação deste projeto para as telonas estava sendo estabelecida desde 2016, quando se iniciou o chamado para jovens que quisessem participar do elenco. Como quase todo projeto que se mantém em produção por muito tempo, ele acabou mudando algumas vezes seu escopo, diretor, roteiristas e até mesmo a ideia de utilizar apenas atores desconhecidos para protagonizar a turma. A demora também fez com que parte do público interessado crescesse, perdendo o tempo ideal para alcançá-lo.
O projeto final conta uma aventura do grupo de amigos formado por Mônica (Sophia Valverde), Cebola (Xande Valois), Magali (Bianca Paiva), Cascão (Theo Salomão) e Milena (Carol Roberto) quando eles ingressam no Ensino Médio. Já no seu primeiro dia, eles recebem a notícia de que o Museu do Bairro do Limoeiro parará de funcionar por conta de dívidas do Professor Licurgo (Mateus Solano), e começam então a agir para tentar evitar que isso aconteça. O que eles não sabem é que existe uma força muito menos terrena que está em ação enquanto eles iniciam este processo.
Existem alguns pontos muito importantes de serem explorados, como o co-protagonismo de uma menina negra em uma produção para o público jovem que não utiliza estereótipos racistas, por exemplo. Há também algumas questões abordadas pelos atores durante a coletiva de imprensa sobre o longa, que vão desde a importância da turma na educação e alfabetização de milhares de crianças, até a criação de personagens diversos e imperfeitos (como todos os humanos) e também uma boa integração da tecnologia, que cria uma conectividade sem alienar os jovens de coisas importantes como a amizade e seu tempo de brincar.
A grande dificuldade do filme é a técnica. Ainda que as boas intenções tenham ficado claras durante a coletiva de imprensa, elas não conseguem ser encontradas na obra que foi apresentada nas horas anteriores. A direção desastrosa não consegue criar o espaço necessário para que essas ideias brilhem e, em alguns momentos, parece sabotar a própria obra.
Já nos primeiros momentos percebe-se que a trilha sonora composta para o longa não acrescente nada para a sua tensão e, pior do que isso, destoa completamente do universo que está sendo estabelecido tentando soar como algo excessivamente moderno. Ainda no início, com a apresentação dos personagens e do conflito, o espectador consegue se manter atento por conta do bom trabalho do elenco. No entanto, quando ele se desenvolve e começa a tentar criar a tensão necessária para interessá-lo na resolução de conflito, há uma decupagem e montagem confusas e que, ao invés de trazer o público para dentro do filme, consegue lembrá-lo o tempo todo que ele se encontra na frente de uma tela. Criando espaços confusos, ações sem continuidade e cortando da ação para cenas irrelevantes, o formato não funciona para criar algo empolgante em um filme de 90 minutos.
Há um fator de nostalgia que até funciona, trazendo por exemplo personagens fantasiados de clássicos da turma, ou até mesmo pequenos detalhes da direção de arte que acenam ao público mais engajado com os personagens. No entanto, isso é insuficiente para sustentar o universo de quadrilogia que é esperado como consequência deste primeiro filme.
O filme está sendo distribuído no Brasil pela Imagem Filmes. Verifique as sessões na sua cidade.
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