A Pior Pessoa do Mundo (Joachim Trier, 2021)

Muito da obrigação de assistir filmes pensando na maior premiação do cinema estadunidense, o Oscar, surge toda vez que os indicados às principais categorias são anunciados. No Brasil, assim como em outros países menos centrais na produção mundial, este anúncio gera uma grande movimentação de mercado tanto para a distribuição dos longas indicados, quanto para o público. É esse o caso de A Pior Pessoa do Mundo, filme de Joachim Trier que teve sua exibição nacional iniciada às vésperas da premiação, visando trazer os curiosos espectadores e cinéfilos aos cinemas.

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O filme, que é definido pelo diretor como “comédia romântica para quem não gosta de comédias românticas”, acompanha a personagem Julie desde seu início da vida adulta até os seus trinta e poucos anos, mostrando recortes de seus relacionamentos, experiências com drogas e grandes decisões. É difícil explicar sua sinopse exatamente porque, em uma cópia cinematográfica da vida real, fala-se um pouco de todos os assuntos que envolvem o amadurecimento e, apesar de não haver uma narrativa com muitas reviravoltas, parece que estamos contemplando uma reflexão bastante profunda sobre o que é a vida na sociedade contemporânea.

Grande parte do sucesso do filme se dá pela mistura entre atuações, fotografia e direção de arte bastante naturalistas simulando a realidade, com a estrutura baseada em capítulos tal qual uma obra literária e trazendo um elemento narrativo que deixa claro a artificialidade do que nos é mostrado. Novamente, homenageia-se estruturas clássicas dos livros para jovens-adultos, ainda mais pelos títulos apelativos e discussões sobre a modernidade trazidas.

O equilíbrio parece ser a principal qualidade do diretor, que também é co-roteirista do filme – também indicado à premiação de Melhor Roteiro Original. Se isso acontece na forma, também se espalha pelo seu conteúdo com situações bastante dramáticas sendo apresentadas de maneira tão humana, cheia de falhas e dificuldades, que é impossível não se identificar. Apesar da possibilidade de explorar os fatos narrativos de maneira mais melodramática, é através da contenção dos sentimentos que a obra ganha força.

A personagem principal é tão multifacetada e enérgica que se torna evidente que ela poderia ser facilmente uma pessoa real. Sua capacidade de tomar suas próprias decisões, se arrepender e ser capaz de continuar vivendo é inspiradora, mostrando uma construção de personagem feminina mais realista do que idealizada, o que frequentemente ocorre quando homens as descrevem. É ainda interessante que o diretor tenha deixado claro que o nu frontal masculino se relacione com o olhar da própria protagonista – afinal, qual mulher sexualmente ativa e que se relaciona com homens que nunca viu um homem nu?!

O tom da obra é crescentemente niilista, principalmente da metade do filme para seu final, criando-se um olhar bastante contemplativo sobre o sentido da vida. Aos espectadores brasileiros há ainda uma identificação final ao se ouvir Águas de Março, em uma versão em inglês, sendo tocada nos créditos finais. Não coincidentemente a música foi composta por um Tom Jobim desacreditado na vida e já com os problemas de saúde que futuramente o levaram à morte.

Felizmente o filme dinamarquês pode ser descoberto por um novo público graças ao destaque dado pela premiação, saindo do radar apenas dos cinéfilos mais dedicados. É um benefício para os espectadores que se deparam com uma obra igualmente divertida e reflexiva, prometendo permanecer em seus pensamentos por dias após a exibição.

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