Amor, Sublime Amor (Steven Spielberg, 2021)

Apesar de reclamações gerais da falta de originalidade dos filmes em realizar remakes que ressurge de tempos em tempos, como estudante da sétima arte, sempre existe uma obrigação em lembrar os espectadores que desde seu início o cinema se pautou em outras narrativas, muitas vezes da adaptação de peças ou novelas, e que fazê-lo adequadamente ou até magicamente não é nenhum demérito. Esse argumento pode ser rebatido ao pensar em remakes que pouco acrescentam ao conteúdo original, como o ocorrido recentemente com live-action de O Rei Leão, que parece apenas querer mostrar uma novidade tecnológica sem grandes adaptações narrativas, mas rejeitar a experiência de um filme apenas baseada nessa argumentação é simplista demais.

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E, quando um mestre como Steven Spielberg decide adaptar uma obra que antes de se tornar um clássico do cinema já o era no teatro musical, é um momento de simplesmente aproveitar a jornada proposta. Com um roteiro shakespeariano contando a história de jovens de grupos rivais que se apaixonam, e a ambientação em uma Manhattan dos anos 1950 e suas disputas entre jovens brancos e latinos, é excepcional perceber o quanto 60 anos podem trazer novas perspectivas sobre o assunto.

Apesar de ser possível escrever um texto apenas com as maneiras que Spielberg atualiza a obra, muito conteúdo do gênero já foi escrito (clique aqui para ver meu favorito, apesar de estar em inglês). Existem, no entanto, alguns aspectos absolutamente impossíveis de ignorar, como o casting de atores latinos para papéis latinos, o espanhol sem legendas para deixar clara a dificuldade de comunicação e o uso de um personagem trans de maneira menos estereotipada, que deixam claro que alguns erros cometidos pelo cinema clássico não são mais cabíveis . Mais do que serem apenas detalhes técnicos incorporados ao longa , fica claro que todos eles têm um sentido narrativo profundo, tornando a obra e os personagens mais vivos através de seus detalhes.

Em relação à criação de novas camadas para os personagens já conhecidos, se torna explícito que o filme não quer trazer à tona dicotomias, mas as origens enraizadas dos problemas. O tempo cria o dom da perspectiva e nos lembra constantemente que, por exemplo, a região em disputa pelas gangues realmente se tornará uma área para brancos ricos, e que toda a violência envolvida será maléfica apenas aos envolvidos nela. Apesar de ser mais sutil na questão da gentrificação, fica bastante claro o quanto a narrativa se opõe a qualquer tipo de ódio mesmo mostrando uma violência maior que a obra anterior – algo importante a se reforçar nos Estados Unidos pós-Trump.

Além de criar melhores histórias de origem que se refletem na complexidade dos personagens, há o detalhe do roteiro da criação da personagem Valentina que cria uma doçura inesperada. Ela significa tanto um território neutro no qual o diálogo é uma via possível, quanto uma homenagem ao elenco original pela escalação de Rita Moreno, a primeira atriz latina a ganhar um Oscar de atuação pela atuação como María na adaptação original.

As músicas continuam excelentes e as coreografias são incríveis, nos transportando rapidamente para uma era na qual os filmes musicais eram muito mais apreciados. Isso é ressaltado pela expertise do diretor, que consegue utilizar a fotografia para expressar os sentimentos das personagens – seja pelo foco nos olhos dos atores na cena em que Bernardo e María se veem pela primeira vez, ou através do uso do reflexo de Valentina no vidro quando Bernardo está em fúria, ressaltando a importância da temperança ao invés do impulso.

Este é um caso no qual o remake é muito cabido e funciona de maneira ideal para recontar uma história desconhecida pelas gerações mais jovens, trazendo uma mensagem importante do diretor nas entrelinhas. Felizmente, Spielberg nos mostra novamente que consegue ser um diretor clássico na forma, mas com execução perfeita.

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