Crítica | 50º TIFF | Hamnet

Hamnet (Estados Unidos e Reino Unido, 2025)

Título Original: Hamnet
Direção: Chloé Zhao
Roteiro: Chloé Zhao, Maggie O’Farrell
Elenco principal: Jessie Buckley, Paul Mescal, Joe Alwyn, Emily Watson, Jacobi Jupe
Duração: 2h 05min (125 minutos)

Talvez uma das adaptações literárias mais esperadas do ano, Hamnet não era ansiado apenas por conta da obra de Maggie O’Farrell, mas também por ser o novo longa-metragem de Chloé Zhao. Após uma grande surpresa com Nomadland (2020) recebendo três Oscars e, em seguida, dirigindo o fracasso de bilheterias Eternos (2021) sob tutela da Marvel, era difícil prever como seria o próximo passo de sua carreira.

Felizmente, com uma pausa um pouco maior entre os projetos, ela retorna com algo avassalador. Se o texto original de O’Farrel já é reconhecido por seu revisionismo histórico (aqui, falo a partir de pesquisas, pois infelizmente ainda não li o livro) ao incluir detalhes e cores à vida de Agnes Hathaway/Shakespeare (Jessie Buckley) e William Shakespeare (Paul Mescal), o filme é capaz de nos transportar para outra época e outro ritmo, sem com isso parecer antiquado ou lento. Zhao dá aos espectadores o tempo de compreender os personagens, suas ações e motivações, e com isso, quando a tragédia acontece, estamos todos tão investidos nos acontecimentos que é impossível não se entregar aos sentimentos.

O filme trata de um longo período de tempo, que vai desde antes de Agnes e William se conhecerem até o momento em que Hamlet é finalmente performado em um palco. Ele passa mais pelos momentos mais importantes com elipses temporais elegantes do que tenta estabelecer uma linha do tempo precisa, até porque assim ele evita o perigo de fanáticos por história acusarem a obra de não ser realista por conta de detalhes. A essência é mais importante que a fidelidade exata, e em um momento em que muitos filmes biográficos tendem a se manter muito fieis aos fatos, é feliz ver um que isso importa menos.

Quando conhecemos Agnes Hathaway, ela é apenas uma mulher com uma má reputação de bruxaria e um interesse muito maior na floresta ao redor de Stratford-Upon-Avon do que em lidar com as pessoas.  Distraída com seu treinamento de falcões, ela é conhecida por conseguir enxergar a alma de uma pessoa ao encostar entre seu polegar e indicador, e quando ela faz isso com o recém-chegado William Shakespeare e enxerga todas as possibilidades de sua criatividade, dá uma chance para um romance. Estamos envolvidos em todo esse cortejo do casal, assim como nos momentos mais importantes de suas vidas, reforçando o laço emocional entre público e tela. Isso, somado a uma performance visceral de Jessie Buckley, fizeram com que praticamente toda a sala de cinema chorasse ao final da exibição. O que a atriz consegue fazer através do contraste de sua atuação antes e depois dos acontecimentos, com um envelhecimento postural do luto imprimindo em sua atuação. Mescal, que ganhou mais notoriedade com o igualmente choroso Aftersun (2022), não apenas acompanha a performance feminina como a complementa, equilibrando os sentimentos que vemos em tela. Ainda sobre as atuações, o jovem Jacobi Super, que interpreta o filho Hamnet, também consegue trazer uma profundidade complementada pelo roteiro brilhante.

Todas as questões de figurino, maquiagem, cinematografia, edição, parecem simplesmente acompanhar o que é proposto aos personagens, trazendo um complemento às atuações. Esse elemento é colocado acima de todos os outros que compõem um filme, mas ainda assim todos os detalhes são bem pensados, os planos são inspirados e sentimos a imersão necessária para acompanhar a história. E como o roteiro trazido é bastante sensível e reflexivo, a escolha por não trazer elementos dissonantes ajuda a amplificar a tristeza e tensão.

Como sempre, a arte tocará em cada pessoa no ponto em que mais doer. E, por mais que eu possa relatar a minha experiência pessoal com o luto, o que é tão bonito no filme é mostrar como a arte é um dos poucos elementos capazes de acolher qualquer sentimento e transformá-lo em algo novo e que pode ressoar por infinitas gerações. Se Shakespeare obviamente fez isso com suas peças, o filme de Zhao também será reconhecido por muito tempo por sua qualidade.

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