Crítica | 50º TIFF | Sirât

Sirât (Espanha, França, Marrocos – 2025)

Título Original: Sirât
Direção: Óliver Laxe
Roteiro: Óliver Laxe e Santiago Fillol
Elenco principal: Sergi López, Bruno Núñez Arjona, Stefania Gadda, Jade Oukid, Tonin Janvier, Joshua Liam Henderson
Duração: 1h55min (115 minutos)

A experiência de decidir assistir a um filme em meio a mais de 200 títulos de um festival é complexa. É preciso avaliar por quais festivais ele já passou, recepção, sinopse, gênero, pôster, e criar uma noção de se esse é um título que te interessa ou não. Parte da graça sempre está em encontrar joias perdidas no meio da programação, e também em se deixar ser surpreendido pelo que está sendo exibido. Este último foi exatamente o caso de Sirât, pois a aclamação em Cannes somada ao pôster interessante me levaram a crer que seria alguma espécie de road movie no deserto. E seria difícil estar mais errada e certa ao mesmo tempo do que com essa definição.

Sem ler a sinopse, imaginei que se tratava de algo como uma perseguição política em meio ao Oriente Médio, ou no máximo algo que se assemelhasse a Perdida no Deserto (2023), também assistido no TIFF há alguns anos. Bastava ler a sinopse para descobrir que na verdade se trata de Luis (Sergi López) e seu filho Esteban (Bruno Núñez Arjona) que estão numa rave no meio do deserto do Marrocos tentando encontrar a filha/irmã desaparecida. O título, que se refere à ponte que liga a Terra ao Paraíso para o Islamismo e é explicado já nos créditos iniciais, na realidade se refere ao caminho que eles precisarão passar em sua busca.

Começamos então a obra em um susto, com um eletrônico gritando das caixas de som e um grupo de pessoas desconhecidas aproveitando e se divertindo em um ambiente completamente inóspito. E se há um início que recorda um pouco Clímax (2018) ao apresentar esses corpos em movimento, mal sabemos naquele momento que os filmes se assemelham em mais de um sentido. Logo Luis percebe que ninguém ali conhece sua filha, mas recebe a informação de que haverá outra rave, ainda mais afastada para dentro do deserto. Quando então aparecem militares marroquinos para acabar com a festa por conta de uma emergência nacional, passamos a acompanhar pai e filho nessa empreitada em meio ao inóspito deserto com um grupo de pessoas que vivem a música eletrônica como um estilo de vida.

Nesse momento, já estamos fisgados. Queremos entender esse grupo de pessoas, e como essa pequena comunidade se formou. Queremos entender como eles conseguem permanecer alheios às notícias no rádio de que algo muito ruim está acontecendo no mundo. E ainda mais do que isso, queremos saber se essa família vai encontrar a garota – e qual vai ser a sua pequena família formada dentro dessa alienação europeia no norte da África.

Enquanto vamos formulando essas questões e conhecendo um pouco mais desses personagens, também entendemos o quanto esse espaço no qual se encontram é desolador. Da falta de assistência no caso de um acidente até o fato de precisarem se virar com as provisões que já tinham, a fotografia do filme consegue deixar bem claro o pequeno tamanho do homem em relação à imensidão do deserto. E, se em qualquer momento deixamos a nossa guarda cair, somos lembrados a todos os momentos que esse é um lugar de extrema tensão e sobrevivência.

E mais do que torturar o espectador – algo que ele realmente faz, com bastante violência – ele também nos lembra do quanto a existência humana é relativamente frágil considerando não apenas a natureza, mas também o que nós fomos capazes de inventar militarmente. Quando o drama vai sagazmente se transformando em uma tragédia, é impossível não retornar à reflexão sobre a rapidez da vida e a nossa capacidade infinita de aniquilação. Se inicialmente estamos pensando em um discurso sobre o pertencimento dentro dessa comunidade de desajustados, é impossível terminar o filme sem sentir um gosto final amargo e desolador.

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