Crítica | 75ª Berlinale | Um Completo Desconhecido

Um Completo Desconhecido (EUA, 2025)

Título Original: A Complete Unknown

Direção: James Mangold

Roteiro: James Mangold, Jay Cocks, Elijah Wald

Elenco principal: Timothée Chalamet, Edward Norton, Elle Fanning, Monica Barbaro, Joe Tippett e Heriko Hatsune

Duração: 141 minutos

Fazer filmes sobre pessoas públicas nunca foi uma coisa fácil, mas o trabalho se tornou ainda mais complexo quando Bohemian Raphsody (2018) se tornou um grande fenômeno, ganhando premiações na mesma medida em que agradava o público – mas não a crítica especializada. Em seguida, diversos projetos como este foram sendo realizados, dos melhores, como Rocketman (2019) aos piores, como Back to Black (2014). Assim, mesmo que não seja uma grande novidade contar a vida de grandes pessoas através das telas do cinema, certamente houve um aumento na popularidade desse tipo de produção.

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Parece um passo quase óbvio realizar um filme sobre Bob Dylan, uma das figuras mais importantes para a história estadunidense no último século. Não apenas ele é o único compositor a receber um prêmio Nobel de literatura, como também foi muito impactante ao criar uma fusão de sons entre o clássico folk do país ao recém-nascido rock and roll. O filme produzido pega exatamente este período, indo da chegada de Bob Dylan (Timothée Chalamet) a Nova York até seu famoso show em 1965 – que, caso você não conheça a história, não vou dar spoilers por se tratar do ápice do filme.

Apesar de bem apegada às estruturas de roteiro tradicionais, com arcos narrativos bem especificados e até pouco espaço para criar de formas mais criativas, tudo funciona muito bem por não tentar explicar toda a vida do artista em apenas uma obra. Não se tenta, por exemplo, falar da vida do cantor antes de ele entrar na música, ou de todos os sucessos que ele lançou em sua prolífica carreira, se afastando um pouco dessa imagem de biopic que precisa retratar do primeiro ao último suspiro da vida do artista.

Entra então a importância de uma escalação de atores bem realizada, papel também da direção. Confiar em Chalamet foi uma ótima ideia de James Mangold, com o resultado sendo mostrado em tela a todo momento. Desde sua insistência em aprender a tocar instrumentos até o uso de sua própria voz nas canções, o ator conseguiu alcançar uma atuação realmente impressionante tanto em semelhança com a figura real quanto por conseguir avançar na construção do personagem em telas, mostrando seus conflitos e amadurecimento. Já nos primeiros minutos a intensidade do personagem se vê refletida em tela, quando não vemos o personagem falar por diversos minutos – a observação e a introspecção serão, assim como na vida do artista, grandes aliadas. É também bastante sensível o trabalho de Elle Fanning como sua namorada Sylvie Russo e de Monica Barbaro como Joan Baez, mostrando também as contradições do protagonista em seu trato com as figuras femininas.

É impecável o trabalho da direção de arte, que recria looks icônicos da época e nos transporta para aquele momento através dos objetos apresentados na casa de cada personagem. Quando isso se soma a uma fotografia e edição que prezam captar um pouco do espírito do tempo, mostrando por exemplo o andamento dos protestos pelos direitos civis dos negros nos EUA no período e até comportamentos que eram comuns na época – como a ausência do trabalho doméstico masculino, tem-se uma obra perfeitamente crível e que permite a imersão naquele momento.

Talvez sua maior dificuldade esteja em mostrar o não-conformismo do Dylan real em uma questão mais formal, dado que o filme realmente tem todas as características do cinema mais clássico estadunidense. Ironicamente, ele está contando uma história sobre as inovações sem utilizar nenhuma por si mesmo. Até isso causa uma dualidade, ao mesmo tempo permitindo que a história seja contada e alcance um grande número de pessoas, mas também não parecendo refletir a sua própria mensagem de rebeldia.

Assim, temos um filme que claramente funciona para público e crítica, mas sobre o qual eu honestamente gostaria de saber a opinião de Bob Dylan.

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