Crítica | Betânia

Betânia (Brasil, 2025)
Título Original: Betânia
Direção: Marcelo Botta
Roteiro: Marcelo Botta
Elenco principal: Diana Mattod, Ulysses Azevedo, Nádia D’Cássia, Caçula Rodrigues, Michelle Cabral, Tião Carvalho, Rosa Ewerton Jara e Vitão Santiago
Duração: 120 minutos
Distribuição brasileira: O2 Play

Betânia e o retrato poético (e confuso) de um Brasil em extinção

Marcelo Botta constrói em Betânia um retrato visualmente deslumbrante de um Brasil rural que parece resistir — silenciosamente — ao avanço do tempo. O vilarejo que dá nome ao filme e a protagonista é quase um personagem à parte, marcado por dunas imensas, redes balançando ao vento e uma rotina tão simples quanto carregada de simbolismo. O longa propõe uma reflexão sensível sobre a finitude das tradições e dos laços comunitários em um país que muda rápido demais para aqueles que ficaram.

Há uma beleza sincera em Betânia. A fotografia é arrebatadora e captura com lirismo os momentos mais cotidianos — como uma roda de café entre senhoras ou o silêncio que paira sobre a casa de quem ficou viúva. A trilha sonora, repleta de canções regionais – Tião Carvalho na trilha é um achado – , toca fundo ao evocar sentimentos de pertencimento e saudade, funcionando como um protesto suave contra o apagamento da cultura popular. Não à toa, emocionou um senhor maranhense que viralizou nas redes após ver o filme.

No entanto, apesar de tantos acertos formais, o filme sofre com escolhas estruturais que comprometem sua potência dramática. A montagem fragmentada enfraquece o desenvolvimento dos personagens e impede que suas histórias ganhem o fôlego necessário, num quê de dispersão que poderia ter sido evitado. A narrativa, por vezes, se dispersa ao tentar assumir múltiplas formas — ora documentário observacional, ora ficção dramática. Essa indefinição tonal não se resolve ao longo da projeção e termina por diluir o impacto das cenas mais tocantes – com exceção do monólogo final belamente incorporado pela ótima Diana Mattos, tão expositivo quanto emocionante.

A atuação de Diana Mattos é um dos grandes destaques da obra. Ela interpreta uma mulher em luto, que se vê forçada a deixar a casa onde construiu toda a sua vida. Sua personagem carrega em si o peso de uma geração que assiste ao fim de seu mundo, consciente de que as memórias, os hábitos e os saberes comunitários morrerão com ela. No entanto, o roteiro frequentemente abandona esse núcleo emocional para explorar subtramas que não se desenvolvem plenamente — como a sequência extensa em que o genro se perde nas dunas, que pouco acrescenta à narrativa principal e se apresenta estranhamente deslocada.

Betânia quer muito: celebrar a cultura local, homenagear modos de vida esquecidos, refletir sobre o tempo e ainda construir um drama íntimo e tocante. A vontade é legítima, mas o filme parece não saber exatamente como articular todos esses elementos de maneira coesa. Há momentos em que parece se abrir para um mosaico de histórias, mas esse projeto nunca se consolida e algumas individualidades se esvaem. A sensação é de um prato cheio de ingredientes bons, mas mal temperado e mal misturado.

Ainda assim, pelas imagens, pela musicalidade, pela importância de dar visibilidade a um Brasil quase nunca retratado, Betânia é um filme de intenções das mais honestas. Apesar das falhas, carrega em si uma urgência silenciosa: a de registrar, antes que desapareça, um modo de vida que já caminha para o fim.

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