Crítica | Jurassic World: Domínio

Jurassic World: Domínio (EUA, China e Malta 2022)
Título Original: Jurassic World: Dominion
Direção: Colin Trevorrow
Roteiro: Colin Trevorrow, Emily Carmichael (baseado em história de Colin Trevorrow e Derek Connolly)
Elenco principal: Chris Pratt, Bryce Dallas Howard, Sam Neill, Laura Dern, Jeff Goldblum E Justice Smith
Duração: 147 minutos
Distribuição: Universal Pictures
Sinopse: Quatro anos após a destruição da Ilha Nublar, os dinossauros coexistem com os humanos. Esse equilíbrio determinará se os humanos continuarão sendo os predadores dominantes em um mundo com as criaturas mais temíveis de todos os tempos.


Existe algo fascinante e profundamente sintomático na forma como Jurassic World: Domínio tenta encerrar uma trilogia que, desde o início, nunca pareceu saber exatamente qual era sua proposta. Dirigido por Colin Trevorrow, o longa representa o ápice (ou o fundo do poço) de uma Hollywood que enxerga o cinema como um grande algoritmo emocional de nostalgia reciclada e apostas seguras, onde a repetição de fórmulas é confundida com continuidade temática.

Se o cinema vive de ciclos, como muitos afirmam, o de Jurassic World é um caso exemplar da lógica do desgaste — da insistência em prolongar um fôlego que já expirou. O que deveria ser o fechamento de uma trilogia torna-se, na verdade, o símbolo de um sistema exausto, regido por convenções cada vez mais automatizadas que não dialogam mais com o espectador, mas com a planilha do investidor.

A proposta narrativa de Domínio parte de um ponto que, em teoria, abriria espaço para explorar questões complexas: humanos e dinossauros agora coexistem no mesmo ecossistema global, um cenário que beira o apocalíptico e levanta debates sobre biotecnologia, ética e ecologia. Mas tudo isso serve apenas de pano de fundo para a repetição das mesmas perseguições e vilões corporativos de sempre, com a nuance de uma tábua.

Ao contrário do que O Reino Ameaçado tentou construir, mesmo com tropeços, ao buscar uma aproximação emocional e quase trágica das criaturas pré-históricas, Domínio parece ansioso por desfazer tudo isso, como se reconhecesse a ousadia do anterior e optasse por recuar. A ação se dá pelo espetáculo, e apenas por ele. Não há senso de urgência real, tampouco tensão. Cada sequência, por mais ruidosa que seja, parece incapaz de transmitir qualquer perigo palpável.

O retorno dos personagens “legados” (Laura Dern, Sam Neill e Jeff Goldblum) é tratado como um grande trunfo nostálgico. Porém, o que poderia ser um gesto de conclusão narrativa torna-se uma estratégia cínica, limitada a interações preguiçosas e piadas autorreferenciais que reduzem essas figuras a caricaturas do que foram em Jurassic Park (1993). Os diálogos beiram o procedural, entregues com o desânimo de quem parece saber que sua função é apenas ocupar espaço entre os efeitos visuais.

Chris Pratt e Bryce Dallas Howard, protagonistas da trilogia World, seguem funcionalmente inexpressivos, sem qualquer desenvolvimento adicional desde o segundo filme. Pratt continua a atuar no modo “herói de ação domesticador de dinossauros” com a mesma mão levantada e a mesma expressão de sempre. Howard, mesmo com tentativas de protagonismo mais emocional, permanece soterrada por um roteiro que lhe oferece pouco além de corridas e gritos.

Colin Trevorrow, que em 2015 parecia propor uma renovação da franquia com o primeiro Jurassic World, retorna aqui como o arquiteto de um universo em ruínas. Sua direção em Domínio aposta no excesso como muleta estética: são múltiplas locações, tramas paralelas, criaturas híbridas e um vilão corporativo (Campbell Scott, em piloto automático) que parece um Frankenstein mal-remendado de Elon Musk e Tim Cook, sem qualquer camada ou motivação convincente.

O que falta em consistência, Trevorrow tenta compensar com referências, piscadelas e callbacks. Tudo é pensado para funcionar como fetiche nostálgico, mas raramente como dramaturgia. A montagem é errática, incapaz de dar coesão ao emaranhado de cenas que mais parecem uma série de trailers colados uns nos outros. Michael Giacchino, na trilha, tenta evocar o épico, mas sua música perde impacto ao ser constantemente soterrada por uma mixagem de som ruidosa e inchada.

Talvez o mais revelador em Domínio seja o modo como ele encarna essa lógica cultuada da Hollywood atual onde não se cria mitologia, apenas se recicla. O que foi inovação em Jurassic Park, torna-se em Domínio uma repetição ritualística: dinossauros escapam, humanos correm, vilão corporativo quer controlar a natureza, personagens mirins têm a chave da salvação. É um ciclo que se auto alimenta e nunca se encerra, porque não há mais o que dizer, apenas o que reapresentar.E por isso o filme cansa. Porque é um produto que já nasce vencido, desprovido de paixão, e que encara seu próprio público como consumidor de ruídos familiares e não como espectador interessado em novas ideias ou novas formas. Ao final, Jurassic World: Domínio não é apenas um capítulo fraco de uma trilogia. É o retrato de uma indústria presa a um passado que ela mesma não sabe mais como fazer funcionar.

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