Crítica | Mountainhead

Título Original: Mountainhead
Direção: Jesse Armstrong
Roteiro: Jesse Armstrong
Elenco: Steve Carell, Jason Schwartzman, Cory Michael Smith, Ramy Youssef
Duração: 108 minutos
Disponível em: HBO/Max

Já passou um final de semana com amigos e no fim da viagem acabou se desentendendo com eles? A diferença em Mountainhead é que esses amigos são os homens mais ricos do planeta – e o mundo está em caos por causa deles.

A essa altura, já entendemos que os donos das Big Techs não são nossos amigos. Os criadores das inovações que mudaram o jeito como vivemos, antes símbolos de um futuro acessível e democrático, hoje são os grandes magnatas do século e estão dispostos a qualquer negócio para manter e ampliar suas fortunas. Afinal, hoje o caos é modelo de negócio.

Essa crítica está bem clara em Mountainhead – nome inspirado no romance Fountainhead de Ayn Rand –, em que quatro bilionários da tecnologia passam o fim de semana nas montanhas enquanto o mundo pega fogo por conta das ferramentas que eles mesmos criaram. 

O poder é um lugar solitário

Na primeira cena, Randall (Steve Carell) veste um macacão laranja em seu jato particular. A cena lembra 2001: Uma Odisseia no Espaço (1968) e é mesmo como se ele viajasse para outro planeta: o dos super-ricos. 

A ação acontece dentro da mansão luxuosa em que os quatro se isolam — refúgio que espelha como essa elite está distante da sociedade, desconectada da realidade apesar das notificações nas telas sobre o colapso nas ruas. 

A fotografia e a cenografia intensificam a sensação de isolamento, mostrando um ambiente gelado e asséptico, que é tão áspero quanto as relações entre os personagens.

Amigos, amigos, negócios à parte

Apesar de juntos, cada um pensa apenas nos próprios interesses: Randall (Steve Carell) recebe diagnóstico de câncer e busca a vida eterna no transhumanismo; Souper (Jason Schwartzman), dono da casa, tenta vender seu aplicativo de meditação; Venis (Cory Michael Smith) comanda uma rede social com uma atualização polêmica; e Jeff (Ramy Youssef), o mais jovem, está no auge da carreira com seu site de verificação de fatos baseado em Inteligência Artificial.

Eles vivem na eterna especulação de mercado, sem conexão com problemas reais. Venis não confia nas pessoas nem sabe ser pai; Jeff não é amado como deseja; Randall está morrendo, perdendo relevância (e mal sabe cozinhar um ovo!); e Souper vive de aparências para impressionar os amigos ricos.

A tensão principal surge entre Venis e Jeff: Venis quer comprar a ferramenta de verificação de Jeff para equilibrar os danos da sua rede social, que gera desinformação com deepfakes e graves consequências políticas na América Latina e Oriente Médio. Entre cinismo e competição velada, Jeff se destaca ao superar o patrimônio dos outros. Mas apesar da falsa modéstia, ele se beneficia do sistema, revelando-se o mais hipócrita dos quatro.

Distopia em tempo real

A similaridade com a realidade não é coincidência, mas uma sátira muito escancarada da ambição desenfreada de figuras como Mark Zuckerberg, Elon Musk e Sam Altman —  esses dois últimos com desavenças reais.

Segundo o roteirista e diretor, Jesse Armstrong, o roteiro foi escrito no final de 2024, período recente em que essas e outras personalidades do mundo Tech se aproximaram do governo Trump. Gravado ainda em março de 2025, o filme acerta no timing e na crítica ao universo isolado dos bilionários tech. No entanto, o maior trunfo do filme também contribui para a superficialidade narrativa.

Muito papo, pouca ação

Em seu primeiro longa, Armstrong repete o formato da sua série Succession (2018-2023): cenário de caos e as intimidades dos super-ricos embalados em uma comédia ácida. A semelhança aparece nos nomes (Randall no filme; Kendall na série), nas discussões cáusticas e na ideia de uma linha sucessória entre os personagens.

Mas talvez isso funcione melhor na série do que no filme. Afinal, aqui a caricatura dos personagens é um tanto exagerada, com atuações extremamente sarcásticas. Apesar dos diálogos perspicazes, o ritmo das falas e piadas irônicas é frenético, beirando o nonsense, deixando o espectador um pouco atordoado  — e, depois de um tempo, entediado.

O conflito que quase não acontece

A ação do terceiro ato parece uma saída para movimentar um filme que passa a maioria do tempo preso no campo das ideias, abrindo diversos debates relevantes como desinformação, monopólio, transhumanismo, interferência política, fraude e manipulação de mercado — ideias que, infelizmente, não são desenvolvidas de maneira satisfatória.

A atuação de Steve Carell engrandece a obra, mas à medida que a narrativa se transforma em uma comédia de erros seu personagem se torna uma versão de seu personagem mais famoso, Michael Scott.

No fim, Mountainhead faz um retrato instantâneo da prepotência dos donos das Big Techs, mas perde o fôlego na narrativa. A premissa é atual e a crítica pontual, mas a falta de aprofundamento deixa a sensação de uma ideia promissora que não teve tempo de amadurecer.

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