Crítica | Quarteto Fantástico (2015)

Quarteto Fantástico (Estados Unidos, 2015)
Título Original: Fantastic Four
Direção: Josh Trank
Roteiro: Jeremy Slater, Simon Kinberg, Josh Trank (baseado nos personagens criados por Stan Lee e Jack Kirby)
Elenco principal: Miles Teller, Kate Mara, Michael B. Jordan, Jamie Bell, Toby Kebbell, Reg E. Cathey e Tim Blake Nelson
Duração: 100 minutos

De ritmo quase contemplativo, Quarteto Fantástico parte de uma promessa que, por si só, carregava algo de nobre: reimaginar um dos grupos mais icônicos da Marvel com ares de ficção científica sombria, bem distante da caricatura dos filmes anteriores. É uma proposta que revela um olhar curioso, quase autoral, vindo de Josh Trank, então elogiado pelo surpreendente Poder Sem Limites. E, por alguns instantes, esse novo Quarteto parece acreditar de verdade que pode existir para além do convencional.

Talvez a maior virtude aqui resida justamente na recusa em abraçar a fantasia como um dom. Pelo contrário, os poderes surgem como consequência de escolhas impensadas, marcadas por culpa e ambição juvenil. Trank conduz grande parte da narrativa em torno de um sentimento de castigo, quase horror corporal, que ecoa influências claras de David Cronenberg. É uma visão que humaniza e fragiliza Reed Richards (Miles Teller) e seus companheiros, revelando uma juventude levada a enfrentar algo muito maior que eles próprios, com pouco espaço para o heroísmo tradicional.

Nesse sentido, há uma estranha beleza no modo como o filme constrói as relações: o elo entre Reed e Ben Grimm (Jamie Bell) nasce de forma sincera, enquanto Victor Domashev (Toby Kebell) exibe sinais de inveja e ressentimento que poderiam se expandir para algo tragicômico mas que, infelizmente, são abandonados antes de florescer. O tom paciente que domina o primeiro ato e que tanto irritou quem esperava ação frenética é, na realidade, reflexo de uma escolha narrativa que busca detalhar personagens antes de explodir efeitos visuais na tela.

Mas é justamente aí que o filme se parte ao meio. A virada final, forçada pelo estúdio, surge quase como outra obra: Victor retorna como vilão sem construção orgânica, e os quinze minutos de clímax se transformam em um confronto vazio, apressado, incapaz de gerar a tensão que o longa vinha cultivando. Essa pressa trai a atmosfera inicialmente sombria e destrói a promessa de um estudo mais denso sobre juventude, responsabilidade e ciência fora de controle.

Ainda assim, apontar Quarteto Fantástico como “um dos piores filmes de super-herói já feitos” é ignorar as escolhas interessantes que habitam suas brechas. Por mais que falhe (e falha feio no final) o filme ousa tratar superpoderes como trauma, e não como espetáculo. É uma obra partida, dilacerada entre o desejo de autor e o imperativo comercial. Se há algo que fica, é essa sensação amarga de potencial desperdiçado.

Talvez o maior lamento seja perceber que o que poderia ter sido um drama de ficção científica com heróis torturados se perdeu no medo de parecer diferente demais. Porque, em seus melhores momentos, Quarteto Fantástico não queria apenas entreter: queria incomodar.

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