Superman III (Estados Unidos, 1983)
Título Original: Superman III
Direção: Richard Lester
Roteiro: David Newman, Leslie Newman (baseado nos personagens de Joe Shuster e Jerry Siegel)
Elenco principal: Christopher Reeve, Richard Pryor, Annette O’Toole, Margot Kidder, Jackie Cooper, Annie Ross, Pamela Stephenson e Robert Vaughn
Duração: 125 minutos
Disponível em: HBO Max
Existe algo surpreendentemente encantador em Superman III. Por trás da aparente desordem tonal e de um núcleo central que às vezes se rende ao cartunesco sem muito filtro, há um filme que sabe exatamente onde mora seu coração e que o abraça com uma honestidade desconcertante. Sob a direção de Richard Lester, o longa metragem se afasta deliberadamente da solenidade dos dois longas anteriores e mergulha com gosto em uma linguagem de comédia física, visual e romântica que se aproxima, por vezes, de um filme de Jacques Tati ou até de uma screwball comedy clássica. Não por acidente, os momentos mais fortes do filme nascem justamente dessa aposta.

Lester transforma o retorno de Clark Kent a Smallville em uma espécie de cápsula melancólica, solar e inesperadamente doce. Há um naturalismo particular nesse reencontro com Lana Lang (Annette O’Toole, numa performance cheia de delicadeza), que constrói com Christopher Reeve uma química que parece sair do tempo não no sentido nostálgico, mas na ideia de dois personagens que pertencem àquele lugar com a mesma ternura e simplicidade que seus diálogos sugerem. E o mérito está justamente em como o filme permite que esse encantamento se desenvolva sem cinismo. As cenas entre Clark e Lana respiram, têm tempo, e não parecem existir para cumprir função dramática: elas são o próprio centro emocional do filme. Quando Superman III está em Smallville, ele está em casa.
Por outro lado, é inegável que a trama paralela envolvendo Gus Gorman (Richard Pryor) e um núcleo de vilões excessivamente caricaturais infla o filme com um tom que beira o descompromisso total. Richard Pryor está visivelmente deslocado dentro da narrativa e não por falta de carisma, mas por como o roteiro o insere como uma espécie de catalisador de absurdos que descola o longa do restante da sua própria linguagem. Ainda assim, há de se reconhecer que Lester conduz esse caos com uma convicção tão sincera que até nos momentos mais dissonantes, como o clímax tecnológico delirante ou as piadas visuais que se multiplicam nas transições, o filme sustenta um charme estranho, quase ingênuo, de um cinema que não tem medo de se mostrar ridículo, porque compreende que até o ridículo pode ter alma.
Isso fica especialmente evidente na sequência em que Superman enfrenta a si mesmo (literal e simbolicamente) num ferro-velho, numa cena que parece saída de outro filme, de outra proposta, mas que encontra em Christopher Reeve uma entrega tão comprometida que ela acaba se tornando o verdadeiro clímax emocional do longa. Ali, o embate não é entre o herói e um vilão externo, mas entre persona e identidade, entre imagem pública e fragilidade humana. E o filme entende o peso disso. Mais do que qualquer computação ou grandiosidade visual, é nessa luta interna que Superman III se torna relevante.
A sensação final é a de que Lester jamais teve a pretensão de fazer um grande filme de super-herói no sentido convencional. Ele opta por algo menor, mais excêntrico, mas incrivelmente pessoal. Superman III não quer provar nada, não quer revolucionar o gênero, e talvez por isso mesmo acabe nos lembrando que, às vezes, é justamente nos desvios e nos tons menores que mora o maior poder desse tipo de cinema. Um filme que não tem vergonha de ser bobo, desde que seja sincero. E ele é.