Crítica | Um Lobo entre os Cisnes

Um Lobo entre os Cisnes (Brasil, 2024)

Título Original: Um Lobo entre os Cisnes
Direção: Marcos Schechtman e Helena Varvaki
Roteiro: Camila Agustini (com supervisão de Guillermo Arriaga)
Elenco principal: Matheus Abreu, Darío Grandinetti, Alan Rocha, Ester Dias, Rafael Fernandes e Giullia Serradas
Duração: 110 minutos
Distribuição: Vitrine Filmes

Nos primeiros minutos de Um Lobo Entre os Cisnes existe uma sensação incômoda de que a obra poderia se tornar catastrófica – o que felizmente não acontece. Em sua primeira cena, que envolve a introdução do personagem Thiago Soares (Matheus Abreu) e do universo do hip hop nos anos 1990, há movimentos de câmera estranhos e que claramente acontecem para ocultar a existência dos dublês de corpo, comuns aos filmes que envolvem acrobacias de dança. Mas a artificialidade com que isso é realizado nesse primeiro momento infelizmente já desconecta o público da narrativa contada.

A história de Thiago e sua relação com Dino Carrera (Darío Grandinetti) se encaixa bastante no gênero de biografias, com a relação entre eles sendo um dos pontos altos da narrativa. O filme ajuda inclusive a dar visibilidade para essa história, que possivelmente é desconhecida por muitos brasileiros, e poderia ser motivo de orgulho nacional. Assim, com a possibilidade de explorar um gênero que está em alta de popularidade com uma história que se encaixa perfeitamente nos moldes de superação, torna-se quase inevitável a criação de um projeto como este.

Quando o filme começa a se desenvolver, a questão de enquadramentos e captação de imagens deixa de ser um problema, com uma maior naturalidade e um alto grau de realismo para contar a história baseada em fatos reais. É nos raros momentos em que ele ousa criar estilizações que ele encanta mais em relação à dança, criando uma conexão mais profunda entre as duas formas de arte. Se destaca em particular a cena de treino de dança no qual os personagens treinam em círculos enquanto são captados por um movimento de dança circular, com apenas as suas roupas mudando. A transição de passagem de tempo é feita de maneira sensível e que dialoga com a rotina de treinos pesados e repetitivos do balé.

Por outro lado, é difícil se conectar com o personagem principal devido às dificuldades quase triviais que são impostas a ele durante a trama, e que certamente não foram tão simples na vida real. Existe uma insistência em colocar desafios ao personagem que estão mais no campo físico do que psicológico, como a perna quebrada ou mesmo as restrições que a vida de um bailarino profissional impõe. Por se tratar de uma narrativa mais convencional, existe essa necessidade em manter um fluxo de coisas acontecendo, não criando o espaço para desenvolver o psicológico dos personagens, sendo que esta talvez seja a maior dificuldade para um jovem que ingressa em uma modalidade cheia de regras e necessidades específicas. Os fatores apresentados acabam parecendo prosaicos em relação ao esperado para um jovem brasileiro que se vê rapidamente transformado em um grande artista. Passa-se mais tempo reafirmando a sua heterossexualidade do que suas questões internas.

Isso contrasta com o tratamento que é dado a Dino, do qual sabemos pouquíssimo além de sua homossexualidade e seu talento para reconhecer um bom bailarino e treiná-lo. Suas únicas cenas sozinho são apenas relevantes para revelar sua sexualidade e sua doença, algo que se torna ainda mais problemático pelo preconceito que já existe em relação à comunidade LGBTQIAPN+ e o HIV.

Ainda que ele traga visibilidade a um personagem real extremamente relevante e seja um filme tecnicamente competente e confortável de assistir, com um bom ritmo e um roteiro que agrada o público, é necessário pensar um pouco criticamente quanto às suas mensagens implícitas. É humano gostar de uma boa história de superação, mas também é necessário problematizar a reprodução de um discurso um tanto ultrapassado como característica única de um personagem.

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