Crítica | Maré Alta

Maré Alta (EUA, 2024)

Título Original: High Tide
Direção: Marco Calvani
Roteiro: Marco Calvani
Elenco principal: Marco Pigossi, James Bland, Marisa Tomei, Bill Irwin, Sean Mahon, Mya Taylor, Bryan Batt, Todd Flaherty e Karl Gregory
Duração: 101 minutos
Distribuição brasileira: Retrato Filmes

Em 2024, os EUA estavam em plena discussão sobre as eleições presidenciais, com a ameaça que se concretizou da vitória de Donald Trump como presidente do país. Nesse cenário, é estranho pensar em um filme sendo produzido sobre um imigrante  brasileiro que acaba no país por conta de um relacionamento e que precisa decidir o que fazer no momento em que seu visto está perdendo a validade ele permanecerá no país como ilegal.

Este personagem é Lourenço (Marco Pigossi), que desde o primeiro momento da obra aparece com sentimentos dúbios em relação ao viver o “sonho americano”. Ele vive dos rendimentos de um subemprego limpando casas de aluguel sob supervisão de um chefe estourado, dormindo de favor na casa de um senhor viúvo, Scott (Bill Irwin). Percebemos que ele está passando por maus momentos, mas apenas com o desenrolar da história que conseguimos perceber a dimensão da enrascada na qual ele se enfiou por amor. Notamos também que a cidade que ele mora é uma pequena bolha republicana dentro de um EUA conservador, sendo Provincetown uma cidade orgulhosamente LGBTQIAPN+, outra raridade dentro do território.

Se nos primeiros momentos acreditamos que a obra tratará de uma desconstrução deste sonho, ainda mais com a locução do Canto de Regresso à Pátria de Oswald de Andrade em seus primeiros minutos. Infelizmente, logo a narrativa vai para um clichê de tentar curar a dor de um amor com um novo amor. E então, considerando o início de uma relação interracial, ele passa a discutir diversos elementos da hipocrisia estrutural do país. Apesar dessa boa intenção, ele não percebe o quanto ele cai dentro da sua própria crítica, hipersexualizando corpos negros e latinos.

Ao mesmo tempo em que ele faz um bom trabalho ao criar personagens críveis com discussões importantes sobre uso de PreP, referências à cultura gay estadunidense e uma relação belíssima de Lourenço com a natureza que lhe recorda de sua terra natal, ele também se complica ao tentar dar conta de todas essas discussões de modo mais casual, se tornando muito expositivo.

Essa mesma relação acontece com seus elementos técnicos, como a fotografia que por vezes é utilizada de forma reflexiva, mostrando momentos cotidianos como o andar de bicicleta, e às vezes é excessivamente direta, como ao contrapor uma cena de abuso sexual com um elemento fálico na praia. Com essas cenas, percebe-se uma certa inexperiência do diretor Marco Calvani, que está assumindo um longa-metragem pela primeira vez.

Essa inexperiência não se traduz nas atuações, com destaque especial para Marco Pigossi. Ele consegue transmitir bem a dualidade de sentimentos de seu personagem, ainda que esteja colocado em situações narrativas bastante complexas, ainda mais quando a obra se dirige ao seu fim. É importante destacar também Marisa Tomei, que com um personagem secundário consegue passar a empatia e sensibilidade dessa única figura feminina presente na narrativa.

Com algumas escolhas narrativas e estilísticas que diminuem o impacto do filme, ele ainda mostra uma interessante visibilidade desta narrativa de imigração brasileira – algo que tende a ser diminuído nos próximos anos dada a situação política dos EUA.

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